domingo, 5 de junho de 2016

Um governo ilegítimo

Todos sabem que usei este espaço para criticar as ações educacionais de sucessivos ministros de Lula e Dilma. Passei um tempo sem postar neste espaço e retorno agora com 26 dias de um governo ilegítimo, que assumiu interinamente o poder por meio de um golpe parlamentar. O que dizer deste novo cenário no que se refere a educação? Quais as perspectivas?
De hoje em diante vou tentar refletir sobre o assunto, tentando ajudar na organização da necessária resistência dos movimentos educacionais aos ataques aos nossos direitos.
Em primeiro lugar, faz-se necessário entender qual a intencionalidade do golpe e do governo interino, pois isso nos informa qual cenário mais geral teremos em matéria educacional.
Infelizmente, discordando de muitos amigos meus, Dilma não caiu por suas virtudes. Não que os conservadores aprovem as medidas, mesmo tímidas, de inclusão social promovidas no período petista, mas ela caiu por que o grande capital precisava de um governo que topasse realizar os ajustes necessários para resolver a crise pela lógica do andar de cima, sem vacilações ou pressões do movimento social.
O governo de Michel Temer (ilegítimo, não cansarei de lembrar!) possui um caráter provisório. É necessário para aprovar duas grandes ações políticas: aprovar medidas imediatas de ajuste fiscal, tendo como foco a proteção dos lucros e interesses dos credores e, em seguida, rever o patamar de direitos conquistados em 1988.
Assim, as primeiras medidas econômicas foram sintomáticas. Remanejamento de recursos do BNDES (banco para financiar o desenvolvimento produtivo) para pagar juros e amortização da dívida e cortes orçamentários visando fazer caixa para... pagar os juros e amortização da dívida. É lógico que, para manter quieto o setor produtivo que apoiou e financiou o golpe, medidas de combate à sonegação, repatriação de recursos em paraísos fiscais ou elevação de impostos ficou adiada.
A mais importante medida, inclusive pelo seu caráter mais estruturante, é a proposta de criação de um teto para os gastos públicos, tendo por base a correção da inflação do na o anterior. Esta medida, caso aprovada pelo Congresso, engessará o crescimento de direitos sociais e de prestação de serviços à população, leia-se aos mais pobres, posto que saúde, educação, assistência e demais programas, mesmo que universais, não são acessados como regra pelos ricos e pela classe média.
Crescendo em termos de valores nominais apenas o percentual de correção da inflação teremos:
1.       Apenas a correção do aumento de despesas fixas será possível. A inflação provoca aumento de luz, água, serviços necessários ao funcionamento da máquina e também a reposição das perdas salariais.
2.       Como passada a crise a arrecadação voltará a crescer mais do que a inflação (como antes vinha acontecendo), os gastos públicos não poderão aproveitar o aumento de arrecadação para valorizar seus profissionais, melhorar a infraestrutura precária atual ou ampliar a cobertura de saúde e educação. Sobrará mais recursos para as verdadeiras prioridades: o pagamento dos juros e amortização da dívida e para investimentos para criar condições para reprodução do setor produtivo.
O que isso implicará diretamente para os objetivos, metas e estratégias educacionais? Considero que aprovada esta regra podemos dizer que o Plano Nacional de Educação estará oficialmente revogado, mesmo que não isso seja feito de maneira formal. Eu explico os motivos desta afirmação.
1.       O PNE é um plano marcado por contradições, todos sabemos, mas seu caráter é expansionista, ou seja, o cumprimento de suas metas amplia a cobertura escolar em várias etapas e modalidades. A aprovação de um teto de gastos públicos impede o crescimento da oferta, mantendo de forma precária apenas o que existe, na situação em que se encontra. Ou seja, revoga na prática as metas e estratégias de expansão da oferta.
2.       Uma das preocupações do PNE também é com a melhoria do que existe, buscando elevar padrão de qualidade dos serviços prestados atualmente. Isso só é possível com a elevação do padrão de gastos públicos, assim qualquer medida de melhoria de padrão de atendimento, necessariamente significa aumentar o custeio existente, corrigindo a matriz de financiamento daquela escola, daquela rede, daquele serviço acima da inflação. E isto estará proibido.

A luta contra o governo ilegítimo de Temer é a luta para preservar as conquistas da Constituição de 1988 e, ao mesmo tempo, preservar a vigência do PNE 2014-2024.