sexta-feira, 8 de maio de 2015

Desenhando as diferenças entre Fundeb e CAQi

Volto a discutir o absurdo metodológico que representa usar o valor por aluno do Fundeb como parâmetro para o debate sobre o Custo Aluno-Qualidade Inicial. Recordo que regulamentar o CAQi é uma obrigação legal (prazo de dois anos para implementar, conforme o PNE).
Relembrando:
1.       O valor por aluno do Fundeb é produto de uma equação bastante simples: divido o dinheiro bloqueado pelo fundo (menos do que o dinheiro obrigatório de ser aplicado em educação e menor do que o recurso disponível efetivamente) pelo número de alunos de diferentes etapas e modalidades. Encontro um valor médio, o qual é denominado de Valor por Aluno Estadual, posto que tal divisão é feita em cada estado.
2.       Os fatores de ponderação de cada etapa e modalidade nesta divisão descrita acima são arbitrários, não foram fruto de nenhum levantamento científico. As mesmas somente podem variar 30% para cima e 30% para baixo do Valor por aluno das séries iniciais do Ensino Fundamental. Não há estudo oficial sobre o tema e o intervalo contraria fatores encontrados em estudos feitos por diferentes pesquisadores. 
3.       Assim, o Valor por Aluno de cada fundo estadual não é nem o que efetivamente cada município (ou estado) aplica naquela etapa ou modalidade, nem é o valor real da referida etapa. É uma conta de chegada, limitada pelas regras artificiais estabelecida.
4.       O Valor por Aluno dos fundos estaduais mais pobres são ajudados com recursos federais (Complementação da União). Esta contribuição não leva em consideração nenhum patamar de qualidade acordado, se baseia no quanto de aumento o montante estabelecido pela regra permite subir o valor por aluno de cada fundo. Assim, o fundo estadual do Maranhão, por exemplo, com seus recursos próprios chega a uma per capita de R$ 1253,96 para o ano de 2014. Com a ajuda da União é possível chegar a R$ 2285,57. Qual o critério usado para chegar neste patamar? Uma equação matemática redistributiva entre os fundos mais pobres, começando pelo Maranhão. Ao invés de R$ 104,49 reais por mês conseguiu-se oferecer R$ 190,46. Foi feito algum cálculo para verificar se este novo valor é suficiente para prover os insumos básicos para o funcionamento das escolas no Maranhão? Não. Foi feito um cálculo pelo menos para verificar que com este novo valor o piso dos professores seria pago em todos os municípios maranhenses? Também não.
Por esta breve explicação já dá para perceber que em termos metodológicos, o FUNDEB não leva em consideração “os respectivos insumos indispensáveis ao processo de ensino-aprendizagem”, como na estratégia 20.6 está dito que será o parâmetro para construir O Custo Aluno-Qualidade Inicial. E mais, na Estratégia 20.7 é explicitado o entendimento de que fatores devem ser arrolados: “investimentos em qualificação e remuneração do pessoal docente e dos demais profissionais da educação pública, em aquisição, manutenção, construção e conservação de instalações e equipamentos necessários ao ensino e em aquisição de material didático-escolar, alimentação e transporte escolar”. Trabalhar com os atuais valores do FUNDEB é, obviamente, partir de uma base pantanosa, imprecisa, para materializar algo que a legislação pede que seja concreto, que parta de custos efetivos (mesmo que médios) de um conjunto de insumos necessários para garantir um funcionamento aceitável de nossas escolas.
Ao contrário da dinâmica do FUNDEB (valor baseado em quanto meu dinheiro oferece em termos de percapita diante da quantidade de alunos que tenho na minha rede escolar), a matriz do Custo Aluno Qualidade parte de outro caminho metodológico. Vejamos:
1.       Ela foi construída pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação (ver Carreira e Pinto, 2007), aceita pela Conferência Nacional de Educação de 2010, depois incorporada pela Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação (em resolução nunca homologada pelo MEC e que dorme numa gaveta desde 2010) e finalmente incorporada na legislação nacional (Lei nº 13005 de 2014).
2.       Parte da evidência de que uma escola de qualidade (de dado padrão de qualidade) é composta de determinados insumos, dentre os quais destaco a remuneração dos docentes e demais trabalhadores da educação (qual a remuneração aceitável para construir o padrão); as condições de oferta (prédio, ambientes, espaços pedagógicos, espaços esportivos, etc.); o tamanho das turmas (essencial para evitar piora das condições de trabalho e de aprendizado) e o tamanho das escolas (essencial para facilitar a gestão).
3.       Foram construídas escolas ideais (no sentido de padrão) e inseridos nela todos os insumos nos padrões estabelecidos. Após esse procedimento foi aferido o Custo Aluno de cada etapa e modalidade. Ou seja, o Custo Aluno não é uma média ou um acerto entre dinheiro disponível e número de alunos. É o produto do custo dos insumos necessários a dotar a escola de condições de qualidade aceitáveis dividido pelo número de alunos.
A lógica do CAQi representa uma ruptura com a lógica atual do financiamento da educação básica. Ao invés de estabelecer um valor por aluno com parte dos recursos obrigatórios e complementar os mais carentes neste parâmetro, ele propõe estabelecer um padrão inicial de qualidade (inicial por que este padrão tende a ser dinâmico na medida em que a sociedade exige mais benefícios e garantias ou avanços tecnológicos exigem novos espaços escolares) por etapa e modalidade e organizar o financiamento estatal visando dotar todas as redes escolares de condições de cumprir os parâmetros, garantindo que um aluno, independentemente do local de moradia, seja tratado como brasileiro de pleno direito.
Espero que os esclarecimentos sucintos deste post ajudem os membros do governo a entender o quanto é equivocado fazer um sinal de igualdade entre FUNDEB e CAQI e o quanto é prejudicial para o estabelecimento de um padrão mínimo de qualidade partir da lógica financeira atual.




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