segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Carta aberta aos pesquisadores brasileiros da área do financiamento da educação

Já há algum tempo um grupo de pessoas envolvidas com a realização de pesquisas na área do financiamento da educação vem sentindo a necessidade de se criar uma maior articulação entre todos aqueles que atuam nesse campo. Neste sentido, há 5 anos foi criada a Rede de Pesquisadores em Financiamento da Educação (www.redefinanciamento.ufpr.br) como forma de fomentar a troca de opiniões e experiências e divulgar os estudos e pesquisas na área.

Como um passo seguinte nesse processo de fortalecimento da área, surge a idéia de criarmos uma Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação (FINEDUCA) e, juntamente com ela, um periódico: FINEDUCA – Revista de Financiamento da Educação. Ambos nascem com o objetivo de contribuir para que os poderes públicos assegurem a realização do direito à educação pública, gratuita, laica, democrática e de qualidade para todos, mediante um financiamento adequado, com a garantia de fiscalização e controle social.

Tendo por base estes objetivos, a primeira tarefa da associação será a criação e o lançamento da revista FINEDUCA, que se constituirá como um periódico acadêmico online, de acesso livre e avaliado por pares. Ela pretende ser um canal democrático e plural de veiculação de diferentes análises e concepções acerca do financiamento educacional no país e no mundo.

Pretende-se lançar o primeiro número especial da revista FINEDUCA juntamente com a Assembléia de fundação da Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação, por ocasião do 25º Simpósio Brasileiro e 2º Congresso Ibero-Americano de Política e Administração da Educação, organizados pela ANPAE e que acontecerão entre os dias 26 e 30 de abril de 2011, em São Paulo.

Com vistas a organizar a entidade e a revista FINEDUCA, as quais serão independentes e autofinanciadas, estamos convidando todos aqueles que tenham interesse em participar da associação na forma de sócios fundadores para que entrem em contato com o comitê organizador.

Certos de contar com o seu interesse, agradecemos e ficamos à disposição para mais esclarecimentos.

Atenciosamente

Andréa Barbosa Gouveia, Ângelo Ricardo de Souza, José Marcelino de Rezende Pinto,
Juca Gil e Rubens Barbosa Camargo

Comitê organizador da Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação – FINEDUCA

Email para contato: associacao.fineduca@gmail.com

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

8 bilhões devolvidos


Desde que criei este espaço virtual de debate educacional que me esforço em acompanhar a Execução Orçamentária do Ministério da Educação. Este esforço se justifica pelo menos por dois motivos: representa uma contribuição na fiscalização do gasto público e alerta para o fato de que não basta conseguir mais recursos para a educação na Lei Orçamentária, é necessário garantir que o recurso seja gasto e, logicamente, bem gasto.

Em 2010, pelos dados disponíveis, o Orçamento do MEC autorizado foi de 57 bilhões e 598 milhões de reais. Foram liquidados (despesas que foram comprovadas a sua execução) 74% do montante autorizado. E efetivamente pagos apenas 72%. O percentual de recursos empenhados é um pouco maior (85%), mas não há garantias de que os serviços serão prestados no decorrer de 2011. Este percentual é maior por que há sempre no final do ano um grande esforço pra empenhar despesas, mesmo que não exista tempo factível para executá-las no próprio ano.

Chamou mais uma vez a minha atenção o desempenho muito baixo de um dos principais programas federais. Trata-se do Programa “Qualidade na Escola”, que liquidou apenas 30% do valor autorizado (3 bilhões 129 milhões) e pagou efetivamente apenas 25,5%.
É neste programa que estão localizadas três ações essenciais para a materialização do apoio material e financeiro da União para a educação básica. Vejamos o desempenho destas ações.

1ª Ação: APOIO AO DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO BASICA – Foi autorizado 1 bilhão 367 milhões, mas foi liquidado apenas 40,4% e pago 35,7%.

2ª Ação: APOIO A REESTRUTURACAO DA REDE FISICA PUBLICA DA EDUCACAO BASICA – Foi autorizado 1 bilhão e 046 milhões, boa parte de emendas parlamentares. Porém, foi liquidado 15% e pago apenas 9,3%. Interessante é que estão empenhados 65,9%, demonstrando a correria de final de ano para realizar empenhos sem tempo para execução no exercício. O mais espantoso é que nesta ação se encontram os recursos para construção de unidades de educação infantil.

3ª Ação: APOIO AO TRANSPORTE ESCOLAR PARA A EDUCACAO BASICA - CAMINHO DA ESCOLA – Foi autorizado 164 milhões, mas foi liquidado apenas 47,4% e pago 45% do total. A ação consiste no financiamento de aquisição de ônibus escolares pelos municípios.

Caso a divina providência auxilie o MEC (e os estados e municípios) e todo o recurso empenhado seja efetivamente transformado em ações concretas, mesmo assim o ministério deixará de usar 8 bilhões do recurso autorizado. Caso os empenhos não se efetivem teremos então desperdiçado a chance de aplicar em educação 15 bilhões.

Para que possamos fazer uma pequena comparação, o valor empenhado na complementação do Fundeb em 2010 foi de 6 bilhões 714 milhões. Ou seja, o montante não aplicado pelo MEC em 2010, na melhor das hipóteses, representa 28% a mais do que todo o dinheiro aplicado para elevar o custo-aluno em nove estados.

É importante esta comparação por que é justamente no custeio das universidades e institutos federais e na complementação do Fundeb que encontramos o maior percentual de aplicação dos recursos federais na área educacional.

Desperdiçando 8 bilhões (pelo menos) não dá pra afirmar que não é possível elevar a participação da União no financiamento da educação básica.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Valor do piso do magistério em 2011

A pergunta mais recorrente neste início de ano é saber qual é o valor do piso salarial nacional do magistério para 2011.

Infelizmente o ano de 2011 inicia sob o mesmo signo de incertezas que presidiu 2010. Vamos resumir a situação:

A decisão do STF, ao julgar preliminarmente a ADin dos governadores contra o piso, manteve a Lei nº 11.738 de 2008 em vigência, mesmo que a tenha limitado em vários aspectos. Um dos artigos não contestados foi o 5º, onde se pode ler:

Art. 5o O piso salarial profissional nacional do magistério público da educação básica será atualizado, anualmente, no mês de janeiro, a partir do ano de 2009.

Parágrafo único. A atualização de que trata o caput deste artigo será calculada utilizando-se o mesmo percentual de crescimento do valor anual mínimo por aluno referente aos anos iniciais do ensino fundamental urbano, definido nacionalmente, nos termos da Lei no 11.494, de 20 de junho de 2007.


A decisão do Supremo Tribunal Federal de considerar que os efeitos financeiros da Lei valeriam a partir de 2009 orientou o posicionamento do MEC e da Advocacia Geral da União de que o valor do piso em 2009 seria o escrito na lei (R$ 950,00) e que sua correção só caberia ser feita em janeiro de 2010.

O ano de 2010 foi marcado pela polêmica sobre o formato de correção do valor do piso. Prevaleceu a opinião do MEC e da AGU, que estabelece que o valor do piso deva ser igual à variação dos valores efetivamente executados de custo-aluno mínimo das séries iniciais e não os valores projetados e publicados nas portarias interministeriais.

No inicio do ano passado foi repassado de maneira extra-oficial uma orientação aos estados e municípios para que pagassem salários maiores que R$ 1024,67. Apesar de não oficializado, este valor tornou-se o piso realmente existente.

Vale recordar que a Lei do Piso não estabelece a quem cabe a tarefa de decretar o valor. Assim, o MEC não decretou, o presidente da República seguiu o mesmo caminho e o Congresso estava muito ocupado se reelegendo para tratar deste assunto.

Desde 2008 tramita no Congresso Nacional um Projeto de Lei (enviado pelo Executivo) alterando a forma de cálculo da correção do valor do piso. Depois de ser aprovado da forma como queria o governo (reajuste do piso de acordo com o índice inflacionário), o PL sofreu modificações importantes no Senado Federal. Naquela Casa de Leis foi aprovado um substitutivo que estabelece a seguinte sistemática de correção do piso:

“Art. 5º O piso salarial profissional nacional do magistério público da educação básica será atualizado anualmente, no mês de maio, por ato do Poder Executivo.

§ 1º A atualização de que trata o caput dar-se-á pelo percentual de aumento consolidado do valor anual mínimo por aluno referente aos anos iniciais do ensino fundamental urbano, definido nacionalmente nos termos da Lei nº 11.494, de 20 de junho de 2007, verificado entre os 2 (dois) exercícios anteriores ao exercício em que deverá ser publicada a atualização.

§ 2º O reajuste do piso não poderá ser inferior à variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) do ano anterior ao da atualização.

§ 3º A atualização do valor do piso será publicada até o último dia útil de abril, em ato do Ministro de Estado da Educação.” (NR)


Já comentei este conteúdo em outra oportunidade neste blog. Em síntese, a regra seria a seguinte:

1. A correção do piso será igual à variação do valor anual mínimo por aluno referente aos anos iniciais do ensino fundamental urbano verificado entre os 2 (dois) exercícios anteriores ao exercício. Abre uma exceção para o caso desta variação ser inferior ao índice inflacionário, situação em que a correção será pelo valor mais alto entre os dois índices.

2. A competência de legalizar anualmente o valor do piso passa a ser do Ministério da Educação

3. A correção deixará de ser feita em janeiro e passará a ser feita até o último dia útil de abril, vigorando seus efeitos a partir de 1º de maio.

Como a Câmara ainda não aprovou a modificação explicada acima, a Lei continua
valendo e o reajuste deve ser feito a partir de 1º de janeiro.

Caso fossemos aplicar a mesma metodologia utilizada pelo MEC em 2010, teríamos de verificar a variação entre o valor do custo-aluno mínimo nacional entre 2010 e 2009. Já é conhecido o valor mínimo por aluno referente aos anos iniciais do ensino fundamental urbano de 2009, que foi de R$ 1.221,34. Porém, somente em abril conheceremos o valor efetivamente realizado em 2010.

A situação é complexa. Mesmo que a reformulação da lei seja aprovada pela Câmara dos Deputados no início da nova legislatura, a decisão não pode retroagir para prejudicar os professores, ou seja, eles possuem o direito de ter reajuste no seu piso em janeiro. Os mais otimistas consideram possível que O Projeto de Lei seja aprovado em março.

O que fazer? Aí vai uma sugestão.

1º. É melhor calcular o valor do piso mais provável e não acumular dívidas com os professores.

2º Considerando o valor efetivado de 2009 (R$ 1221,34) e o valor projetado para 2010 (R$ 1414,85) a variação seria de 15,84%. Assim, o valor do piso provavelmente ficará em torno de R$ 1187,97.

3º Este valor é sobre a remuneração (salário base mais as gratificações) de um professor com formação em nível médio e com jornada de 40 horas.

4º. Caso o valor seja maior, certamente a diferença a pagar será pequena.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

O Siope está aberto

O Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Educação (Siope), que coleta, processa e torna públicas as informações referentes aos orçamentos de educação da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, já está disponível na internet, para acesso e transmissão.

O prazo de envio iniciou ontem (20 de janeiro) e se encerra no dia 30 de abril para as secretarias municipais e 31 de maio para as secretarias estaduais.

O preenchimento em dia do sistema é condição para que estados e municípios possam celebrar convênios com órgãos federais e receber transferências voluntárias da União.

Se o estado ou município não investir no mínimo 25% do seu orçamento total em manutenção e desenvolvimento do ensino, o FNDE envia, automaticamente, um comunicado aos tribunais de contas estaduais e ao Ministério Público informando o não cumprimento da legislação.

O Portal do FNDE publicou comentário do coordenador do Sistema, Paulo Malheiro:
“No Siope, os gestores têm à sua disposição indicadores educacionais do seu município, que podem auxiliá-los no planejamento das ações e na melhor gestão dos recursos”.

Concordo parcialmente com ele. Atualmente o SIOPE agrupa os dados coletados e produz indicadores, mas infelizmente nem todos os resultados são confiáveis. Destaco especialmente a inconsistência dos dados sobre custo-aluno por etapa e modalidade.

Na verdade a culpa não é exatamente do Sistema, mas do formato dos orçamentos estaduais e municipais. Apresento alguns exemplos que comprovam esta inconsistência:

1. O SIOPE apresenta que o Governo Estadual do Acre aplicou R$ 27,57 por aluno ano no ensino médio. Porém, recebeu do Fundeb um valor de R$ 2.515,68 por cada aluno/ano.

2. O Distrito Federal registrou um gasto de R 1,16 por cada aluno de EJA no ano de 2009, valor obviamente incorreto.

3. O município de Abaetetuba (PA) registrou um gasto de R$ 48,94 por cada aluno de educação infantil no ano de 2009. Acontece que do Fundeb recebeu para creche o valor de R$ 1485,00 e para a pré-escola recebeu R$ 1350,09.

4. O município de Presidente Jânio Quadros (BA) registrou um gasto de R$ 109,89 por cada aluno de educação infantil no ano de 2009. Acontece que do Fundeb recebeu para creche e para a pré-escola o mesmo valor citado para Abaetetuba, pois tanto o Pará quanto a Bahia recebem complementação da União.

O formato dos orçamentos leva a que os dados declarados não sejam fiéis a despesa efetivamente realizada, sendo declarados dados relativos à educação infantil e ensino médio como se fossem do ensino fundamental.

Sem que isso seja corrigido continuaremos lendo absurdos como os que citei acima.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Mudanças no INEP


O Diário Oficial da União desta terça-feira publica a primeira mudança na equipe do MEC no governo Dilma. O presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Joaquim Soares Neto, foi exonerado de seu cargo.
A imprensa associou a sua saída aos recentes problemas de acesso ao portal do SISU pelos estudantes, mas considero que foi apenas o coroamento de um desgaste mais antigo.

A ida de Joaquim Soares Neto para o INEP foi uma aposta feita pelo Ministro de colocar no comando da instituição alguém com experiência em gestão e execução de exames nacionais. Ele veio direto do Cespe, instituição ligada a UnB e que tem vasta experiência em concursos nacionais e organiza o vestibular daquela universidade.
O novo nome para o cargo também foi anunciado no Diário: Malvina Tânia Tuttman, reitora da Universidade Estadual do Rio (UniRio).

Malvina Tânia Tuttman possui graduação em Pedagogia pela Universidade Santa Úrsula, mestrado em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e doutorado em Educação pela Universidade Federal Fluminense. Sua tese de doutorado foi “Compromisso Social da Universidade: os Olhares da Extensão” e sua orientadora a Professora Regina Leite Garcia.

No momento a professora Malvina Tania Tuttman exercia o cargo de reitora da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio), para o qual foi eleita em agosto de 2004 e reeleita em 2008.

Além desta função, a professora Malvina exercia desde 2007 o cargo de Vice-Presidente da Regional Sudeste da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior – ANDIFES.

Vamos esperar as explicações oficiais para a saída de Joaquim Neto e aguardar os primeiros pronunciamentos de Malvina Tuttman.

De qualquer forma o fato do INEP voltar a ser dirigido por alguém ligado à academia e a pesquisa é um bom sinal. Não concordo com a diminuição do papel do INEP a mero intermediário na contratação de empresas para realização de exames em larga escala. Seu papel primordial deve ser o de realizar e fomentar pesquisas educacionais, disponibilizando dados confiáveis, realizando avaliações e estimulando pesquisas a partir deste material.

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

A face do ensino superior em 2009

Nesta semana o INEP divulgou os resultados do Censo do Ensino Superior do ano de 2009. Comento alguns números no dia de hoje.

Em 2009 tínhamos 5,9 milhões de brasileiros no ensino superior. O número de matrículas continua sendo majoritária no setor privado, que corresponde a 74,4% do total. Na fatia ofertada setor público o censo detectou 14,1% de matrículas em instituições federais, 9,5% em instituições estaduais e 2% em instituições municipais.

A oferta de vagas em 2009 também foi majoritariamente privada. Foram 4.264.700 vagas privadas contra apenas 461.694 da rede pública. O problema é que a concorrência existe somente na rede pública, onde em média para cada vaga existiram 5,92 candidatos (quase seis para cada vaga). Nas instituições privadas essa disputa não foi nem de um candidato para cada vaga.

O perfil dos docentes continua sendo bem melhor na rede pública do que na privada. Na rede pública 78,93% dos docentes trabalham em tempo integral, contra apenas 21,53% na área privada. A maioria dos professores da rede privada são horistas. O percentual de mestres e doutores na rede pública já chega a 75% contra apenas 55% na rede privada.

A relação professor X aluno também oferece melhores condições de ensino e de trabalho na rede pública, onde em 2009 existiam um professor para cada 12,39 alunos. Na rede privada este número é quase o dobro (um professor para cada 20,34 alunos).
Um dado que me preocupou foi que as matrículas presenciais e à distância de cursos de pedagogia praticamente são equivalentes, sendo 287.127 matriculas presenciais e 286.771 oferecidas à distância. Aliás, pedagogia é o curso com maior oferta nesta modalidade, tendo superado o curso de Administração. Parece que este dado mostra uma escolha de modelo para suprir a falta de formação dos docentes, especialmente os que estão em exercício.

Espero conseguir comentar outros aspectos no decorrer dos próximos dias.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

31° Congresso Nacional da CNTE

Na tarde de hoje inicia aqui em Brasília o 31º Congresso Nacional da CNTE – Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação. O tema central do evento é “O PNE na Visão dos Trabalhadores em Educação”. Durante quatro dias, 2500 trabalhadores em educação indicados por 41 entidades filiadas à CNTE de 26 Estados, 14 municípios e o Distrito Federal, estarão reunidos para debater temas que estão na pauta nacional da educação pública e para eleger a nova direção da CNTE.

Apesar de não ter sido convidado para o evento, tenho um apreço muito grande pela CNTE. Em 1983 ajudei a fundar o que mais tarde se tornou o Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado do Pará (SINTEPP). Em 1984 fiz parte da primeira delegação paraense a comparecer a um Congresso da Confederação dos Professores do Brasil (CPB), entidade que foi democratizada, cresceu em representatividade, fundiu-se com outros segmentos educacionais e se transformou na atual CNTE. Tive a oportunidade e a honra de compor a direção nacional e contribuir com sua consolidação.

Considero muito oportuno o tema que foi escolhido. É muito importante que os trabalhadores em educação discutam o conteúdo do Projeto de Lei 8035/10, que institui o novo Plano Nacional de Educação. Não existirá um plano representativo do sentimento da maioria dos educadores e do povo brasileiro sem que haja intensa e organizada pressão social e, sem sombra de dúvida, a CNTE é peça importante neste processo.

Em postagens anteriores iniciei reflexões sobre o conteúdo do Projeto de Lei que tramita no Congresso Nacional, mas destaco aqui os principais desafios que merecem atenção dos delegados e das delegadas deste Congresso de Trabalhadores em Educação:

1º. A CONAE aprovou um percentual de investimento público em educação superior ao enviado pelo governo federal. É necessário tornar a luta pelos 10% do PIB um dos eixos de mobilização da sociedade civil brasileira.

2º. O Projeto de Lei não estabelece a divisão de responsabilidades entre os entes federados para cumprir as metas descritas no texto. A falta de um regime de colaboração tem tido um efeito deletério na educação nacional. Não existem condições de alcançar determinadas metas sem um aporte decisivo da União. A impressão que tenho é que o MEC considera que o patamar alcançado de investimento é suficiente. Infelizmente não são!

3º. Um dos eixos do PNE em tramitação é a valorização do magistério, mas falta esclarecer e estabelecer quem vai pagar a conta. Implicitamente o projeto trabalha com a visão de que o atual formato de FUNDEB viabiliza que todos os estados e municípios paguem o piso e, progressivamente, no decorrer da próxima década, os professores passarão a perceber salários equivalentes aos recebidos por profissionais de igual formação. Respeito aqueles que acreditam em milagres, mas em políticas públicas eles são muito raros. Sem alterar o padrão de financiamento só mesmo apelando para a divina providência.

4º. Inúmeras metas são inferiores ou contrárias ao votado pelos delegados da CONAE, onde a CNTE teve um peso decisivo. Destaco duas metas apenas como exemplo. O estabelecimento de um ProUni para o ensino profissionalizante vai na contramão da decisão da Conferência sobre verba pública somente para escola pública. A outra, tão grave, é que o projeto silencia sobre o percentual de crescimento da rede pública de educação superior.

Desejo um bom Congresso.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Mais do mesmo?

No último dia de 2010 o Portal IG publicou uma entrevista com Fernando Haddad, naquele momento já confirmado por Dilma para permanecer à frente do Ministério da Educação.

Li atentamente para tentar descobrir novidades para o próximo período, mas infelizmente na maior parte da entrevista encontre “mais do mesmo”, ou seja, continuidade do que ele já vem fazendo ou defendendo. Não que isso seja negativo em si, 0mas parece ser uma constante em quem permanece no cargo por mais um período, sejam prefeitos, governadores e ministros: achar que já encontraram o caminho certo e não precisam fazer ajustes.

Selecionei três trechos que me chamaram a atenção. Quando perguntado sobre as prioridades para os próximos anos, o Ministro afirmou que a presidenta “incorporou ao seu discurso a idéia de que temos de atuar da creche à universidade” e criticou “política de foco” que prevaleceu no governo FHC. E listou três prioridades: educação infantil, diversificação do ensino médio e escola de tempo integral.

Sobre a participação financeira da União para que as coisas saiam do papel ele foi bem evasivo, e citando o ProUni afirmou que às vezes a questão não é de recurso e disse que o programa “não custou nada diante do alcance que ele tem”. Ao final minimizou dizendo que “com mais recursos, podemos fazer muito mais”.

Uma parte grande da entrevista tratou da prova nacional de concurso para a carreira docente. Afora anunciar que a mesma deve ser aplicada no início de 2012, chamou minha atenção o trecho que transcrevo abaixo.

“Queremos que os prefeitos e os governadores possam oferecer boas condições de carreira para atrair os melhores profissionais do Brasil. O prefeito tem pouco estímulo para reestruturar a carreira. Estamos dando as condições de eles mudarem o sistema de ensino. Essa prova vai incidir sobre as condições de carreira”.

Do que destaquei posso tecer os seguintes comentários:

1. Espero que a presidenta realmente tenha incorporado ao seu discurso uma atenção universal aos desafios educacionais. A política de focalização não fez nenhum bem a garantia do direito à educação. Mas espero que essa “incorporação” seja também prática e não apenas de discurso.

2. Das três prioridades listadas rapidamente pelo Ministro não tenho discordâncias (e certamente serão listadas outras no decorrer da gestão), mas me preocupa uma contradição entre o desafio de diversificar o ensino médio, que pareceu mais uma preocupação curricular, de formato do ensino médio ofertado e as propostas defendidas pela presidenta no seu discurso de remeter para a iniciativa privada, via ProUni do ensino médio, a expansão do setor.

3. Concordo que são necessários incentivos para que prefeitos invistam na valorização do magistério, mas isso não pode ser resumido à aplicação de uma prova nacional que barateie o ingresso nas esferas municipais. O principal problema para estruturar carreiras atrativas é financeiro. A prova incide lateralmente sobre a carreira, pode melhorar a qualidade dos profissionais que ingressam, mas sem melhores salários e sem garantia de progressão salarial no decorrer do tempo dificilmente a carreira será atrativa.

4. Quando falo que no geral parece “mais do mesmo” é que para o MEC o formato do financiamento já está resolvido, que a contribuição da União já é suficiente. Discordo dessa tese. Na verdade ela está implícita no discurso.

Foi apenas uma primeira entrevista de final de ano, vamos aguardar os posicionamentos futuros para conclusões mais definitivas.

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Primeira medidas fiscais de Dilma

Reproduzo interessante análise da Auditoria Cidadã da Dívida (www.divida-auditoriacidada.org.br) sobre a continuidade da política de ajuste fiscal em nosso país.

Os jornais deste final de semana destacam o discurso de posse da presidente Dilma Rousseff, no qual ela afirma que “encerramos um longo período de dependência do Fundo Monetário Internacional, ao mesmo tempo em que superamos a nossa dívida externa”.

Porém, conforme comentado diversas vezes por esta seção, as políticas impostas pelo FMI continuam sendo implementadas, a exemplo do forte ajuste fiscal a ser definido nos próximos dias. Segundo a Folha Online, “A presidente Dilma Rousseff abre seu primeiro dia útil de trabalho, amanhã, definindo o tamanho dos cortes de gastos necessários para equilibrar o Orçamento. Ela se reúne logo pela manhã com o ministro Guido Mantega (Fazenda) e seu secretário-executivo, Nelson Barbosa, para tratar da questão do ajuste fiscal.” Por sua vez, o jornal Estado de São Paulo informa que “Técnicos trabalham num bloqueio preventivo de todo o Orçamento de 2011.”
No sábado, o Ministro da Fazenda falou novamente em ajustes e reforçou o discurso de cortes de gastos, conforme mostrou o Portal G1. Segundo o Ministro, é necessário fazer um ajuste fiscal que garanta de fato o cumprimento da meta de superavit primário.

Tal política mostra que a dívida não foi superada, e continua sendo, cada vez mais, o centro dos problemas nacionais, pois para pagá-la, vultosos gastos sociais continuam sendo cortados.

Outras políticas do FMI também continuam vigentes, tais como as reformas da previdência, que continuam reduzindo cada vez mais as aposentadorias, por meio de mecanismos impostos pelo Fundo, tais como o Fator Previdenciário. O Portal G1 traz afirmação do Ministro da pasta, Garibaldi Alves:

“A reforma da Previdência sempre é um desafio que se apresenta como as outras grandes reformas que o país tem pela frente. Agora, só quem pode dizer como será e qual a dimensão da reforma será o próprio governo através da liderança da presidente”.
Conforme já a
ntecipado na edição de 8/12/2010 desta seção, o Ministro já incorporou o falacioso discurso de rombo da Previdência. No sábado, ele afirmou: “Eu estou ainda me inteirando da situação, não tenho nenhuma fórmula milagrosa [para reverter o rombo]”.

Já no caso da saúde, o governo Dilma também segue a visão defendida por instituições multilaterais como o FMI e o Banco Mundial, de que o principal problema seria a gestão dos recursos, e não a falta dos mesmos. A Agência Câmara mostra que o Ministro da Saúde, Alexandre Padilha, considera que “é preciso mudar a gestão da saúde no Brasil”, e que “o fato de o governo ter maioria no Congresso facilitará a discussão de projetos de interesse do País.”

Ou seja: tais afirmações indicam que o governo Dilma irá trabalhar para aprovar no Congresso o Projeto de Lei Complementar (PLP) 92/2007, de iniciativa do Poder Executivo, que institui as chamadas “Fundações de Direito Privado”, que privatizam serviços públicos essenciais como saúde e educação e retiram direitos dos servidores públicos. O Projeto já se encontra pronto para votação no Plenário da Câmara.

Ou seja: diferentemente do discurso de posse da presidente Dilma Rousseff, o país continua aplicando as políticas recomendadas pelas Instituições Financeiras Multilaterais.

A presidente disse também, em seu discurso de posse, que a dívida externa teria sido superada, sob o argumento de que o país deteria reservas em dólares suficientes para pagar toda esta dívida. Porém, cabe comentarmos que grande parcela da dívida externa é simplesmente omitida da contabilidade geralmente divulgada pelo governo. Esta parcela é formada pelos chamados “empréstimos intercompanhias”, ou seja, dívida das filiais de multinacionais com suas matrizes no exterior, que chegaram a US$ 91 bilhões em novembro, conforme Tabela do Banco Central, Quadro 51.

Conforme esta mesma tabela, o total da dívida externa é de US$ 338 bilhões, bastante superior aos US$ 286 bilhões das reservas internacionais, constante no Quadro 4 da mesma Tabela disponível na página do Banco Central. Além do mais, esta montanha de reservas foi feita às custas de mais dívida interna, que paga os maiores juros do mundo, e por isso é muito mais rentável aos investidores, também porque é denominada em reais, que tem se valorizado frente ao dólar.

Ou seja: mesmo que o país usasse todos os dólares de suas reservas para pagar a dívida externa – o que nem sequer é possível – estaria-se meramente trocando uma dívida por outra, que paga juros muito mais altos e possui prazos bem mais curtos.
A falácia da “superação da dívida externa” também não resiste a diversos outros fatos, tais como o de que a dívida externa não é a única despesa feita com as reservas, que também podem cobrir, por exemplo, as vultosas remessas de lucros das multinacionais aqui instaladas para suas matrizes no exterior, que geram grande rombo nas contas externas brasileiras.

Outro trecho do discurso de posse de Dilma Rousseff mostra que esta política deve continuar:

“Continuaremos fortalecendo nossas reservas externas para garantir o equilíbrio das contas externas e bloquear, e impedir a vulnerabilidade externa”.

Portanto, parece que o desequilíbrio das contas externas continuará a ser coberto pelo acúmulo de reservas, às custas do aumento da dívida “interna” que paga os juros mais altos do mundo.

Um argumento também utilizado por Dilma é de que as reservas serviriam para impedir a “vulnerabilidade externa”, ou seja, impedir fugas de capitais durante crises financeiras. Porém, a melhor forma de impedir tais fugas – sem gerar uma imensa dívida – é o controle sobre o fluxo de capitais.

Em seu discurso, Dilma também afirmou que “É, portanto, inadiável a implementação de um conjunto de medidas que modernize o sistema tributário, orientado pelo princípio da simplificação e da racionalidade”.
O risco é que, por trás deste argumento
de “simplificação” e “racionalidade”, esteja a intenção de Dilma de insistir na proposta de Reforma Tributária apresentada pelo governo em 2008, que extingue contribuições para a Seguridade Social (que reúne as áreas de Previdência, Assistência e Saúde), unificando tais tributos em um “Imposto sobre Valor Agregado”. Isto fragilizaria as fontes de recursos da Seguridade, que assim poderiam ser redirecionadas para o pagamento da dívida.

Conforme mostra o jornal O Globo, a redução da contribuição previdenciária patronal sobre a folha de pagamento - um dos pontos desta Reforma de 2008 - já foi ordenada por Dilma à sua equipe. Tal proposta também pode fragilizar as contas da Seguridade Social, e assim fortalecer o falacioso discurso de déficit da Previdência, como justificativa para reformas que tiram direitos dos trabalhadores.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Divulgados os números para o Fundeb 2011

O Diário Oficial da União do dia de hoje publicou a Portaria Interministerial nº 1459 de 30 de dezembro de 2010. O texto divulga os principais números do Fundeb para este ano. Em resumo:

1. O valor mínimo por aluno das séries iniciais urbanas (indexador do fundo) será de R$ 1.722,05. Ainda não temos o valor efetivamente realizado em 2010 (isso só é publicado em abril), mas se a previsão se realizou, o valor representa um aumento de 21,7%.

2. A previsão do Ministério do Planejamento sobre a arrecadação estadual e municipal, enviada ao Congresso junto com a proposta de orçamento para 2011 não se confirmou. A previsão era de 90,8 bilhões de depósito, mas a portaria revisou para 86,6 bilhões (4,6% a menor).

3. A previsão citada acima trabalhava com uma complementação obviamente maior. Com a dedução dos 10% para ajudar estados e municípios a pagarem o piso (espero que este ano algum ente federado consiga receber!) a complementação ficou em 7,8 bilhões, ou seja, maior do que 2010 em mais ou menos 1 bilhão caso os 866 milhões sejam efetivamente repartidos para quem precisar de ajuda para valorizar o magistério.

4. O estado do Rio Grande do Norte mais uma vez ficou perto de receber recursos da complementação. Em 2011 continuaremos com os nove estados atuais recebendo o dinheiro da União (Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Maranhão, Pará, Paraíba, Pernambuco e Piauí).

5. A diferença entre o estado com maior valor por aluno (Roraima) e os estados com menor valor (nove estados citados acima) diminuiu e agora está em 1,69 vezes. O ano passado estava em 1,88. Redução lenta, mas positiva.

Os números apresentados mostram que a baixa evolução das matrículas ajudou a elevar o valor da correção. Enquanto a arrecadação das finanças dos estados e municípios aponta para um crescimento de 13,7% em relação à projeção do ano anterior (e contra uma inflação de 6,24%), as matrículas estaduais e municipais decresceram em 6,4%. Somente a matrícula em creche cresceu (7,7%), as demais caíram.

A educação no discurso de posse de Dilma

No sábado passado a nova presidenta Dilma tomou posse no Congresso Nacional. No seu discurso de posse reservou um trecho para falar de suas prioridades educacionais. Reproduzo o trecho abaixo e em seguida faço alguns comentários.

Queridas brasileiras e queridos brasileiros,
Junto com a erradicação da miséria, será prioridade do meu governo a luta pela qualidade da educação, da saúde e da segurança.
Nas últimas décadas, o Brasil universalizou o ensino fundamental. Porém é preciso melhorar sua qualidade e aumentar as vagas no ensino infantil e no ensino médio.
Para isso, vamos ajudar decididamente os municípios a ampliar a oferta de creches e de pré-escolas.
No ensino médio, além do aumento do investimento público vamos estender a vitoriosa experiência do ProUni para o ensino médio profissionalizante, acelerando a oferta de milhares de vagas para que nossos jovens recebam uma formação educacional e profissional de qualidade.
Mas só existirá ensino de qualidade se o professor e a professora forem tratados como as verdadeiras autoridades da educação, com formação continuada, remuneração adequada e sólido compromisso dos professores e da sociedade com a educação das crianças e dos jovens.
Somente com avanço na qualidade de ensino poderemos formar jovens preparados, de fato, para nos conduzir à sociedade da tecnologia e do conhecimento.
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Não consegui ler nenhuma palavra que já não tenha sido dita pelo atual Ministro nos últimos tempos, mas me chamou a atenção os seguintes aspectos:

1º. A presidenta reforçou o compromisso com a ajuda aos municípios brasileiros para que cresça a oferta de vagas públicas em creche e pré-escola. Não tem como medir o significado da palavra “decididamente”, mas serve de elemento para cobrança de programas mais audaciosos nesta área. Para ser realmente uma postura decidida certamente o ritmo e formato do Proinfância precisará sofrer mudanças.

2º. Deu formato de promessa a proposta de estender o ProUni para o ensino profissionalizante. O formato deste programa significa trocar vagas por isenção fiscal. Os dados do ensino médio associado à profissionalização mostram que a iniciativa privada abocanhava 12,3% das matrículas. A rede federal tinha 34,9% e a estadual 48,1%. Além de drenar recursos públicos para a iniciativa privada, é de questionável eficácia e representa uma mudança de rumo na linha atual de crescer a rede federal. Essa medida incentivará a iniciativa privada converter vagas normais em cursos técnicos de qualidade questionável, pois enquanto possuíam 21.637 alunos nesta área, no formato regular este universo representava mais de 900 alunos. Um presente muito generoso para as grandes corporações, muitas internacionais, que dominam o setor privado de ensino médio.

3º. Disse o óbvio sobre os professores: são importantes, devem ganhar bem e ser bem formados. Mas não disse como o governo federal pretende auxiliar estados e municípios a alcançar estes objetivos.

No dia 31 de dezembro o ministro Haddad concedeu uma entrevista ao IG. Vou comentá-la amanhã, na esperança de descobrir algumas pistas novas sobre o que esperar do governo em 2011.