sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Cada vez mais o ensino é uma mercadoria


Apesar de 30,9% dos jovens entre 18 e 24 anos estudarem, apenas 13% já conseguiu adentrar num curso superior. A meta estabelecida pelo PNE é de 30% de atendimento em 2011, o que dificilmente será atingido no ritmo atual de crescimento.
O principal problema não é a dificuldade de acesso de nossos jovens ao ensino superior, mas a característica eminentemente privada deste acesso.
Ao contrário do que os próceres governamentais apregoam a iniciativa privada não tem do que reclamar no atual governo. Para chegar a esta conclusão só é necessário acessar os dados dos censos do ensino superior de 1994 a 2006, todos disponíveis no site do INEP (http://www.inep.gov.br/). E, obviamente, lançar um olhar crítico sobre as tabelas disponibilizadas pela referida instituição.


E o que os números dos censos podem nos dizer?


Tomei a liberdade de comparar as taxas de crescimento das matrículas da rede pública e da rede privada ao final de cada período dos últimos presidentes de nosso país. Verifiquei também a composição deste crescimento nos primeiros quatro anos de governo Lula.
No primeiro mandato de FHC presenciamos um crescimento da rede privada na ordem de 36,12% contra um percentual de apenas 16,55% da rede pública. Assim, a participação privada no total das matrículas passou de 58% para 62%.
No segundo mandato de FHC, houve uma maior desregulamentação do setor privado e isso teve efeito imediato na sua taxa de crescimento, que acumulou 84%. A rede pública cresceu de forma mais acelerada (32%) em comparação ao período anterior, mas ao final o hiato só fez aumentar, terminando em 2002 com uma participação pública de apenas 30% no total das matrículas.
O primeiro mandato de Lula não reverteu esta tendência de maneira significativa. É verdade que reduziu pela metade o ritmo do crescimento privado alcançado nos anteriores, cravando um crescimento de 43%. Porém, o crescimento da rede pública, ao contrário da propaganda oficial, foi de apenas 15%%. A conseqüência é fácil de concluir: continuou aumentando o hiato entre participação privada e pública. Em 2006 a rede privada representou 74% contra 26% da rede pública.
Analisando de forma mais detida os dados de 2002 e 2006, com o intuito de não cometer nenhuma injustiça com o esforço de crescimento de matrículas que é apresentado na imprensa pelo governo Lula, verifiquei as taxas de crescimento da rede pública, e dentro dela das instituições federais, estaduais e municipais. E também as mesmas taxas na rede privada, distinguindo as instituições comunitárias ou filantrópicas das genuinamente privadas.
De 2002 para 2006 houve um crescimento de 15% da rede pública, mas a rede federal contribuiu com 58.187 novas matrículas de um total de 157.649. Ou seja, este crescimento baixo só não foi pior porque as redes estaduais e municipais continuaram crescendo, mesmo que a competência pela oferta do ensino superior seja federal e isso sobrecarregue os cofres destes entes federados. Aliás, entes federados que não conseguiram melhorar o acesso nas etapas que são suas obrigações constitucionais, como mostram os dados preliminares do censo escolar da educação básica de 2008.
Na área privada, que contou com um crescimento de 43%, foram efetivadas 1.039.084 matrículas, sendo que 64% foram em instituições com fins lucrativos.
Aliás, reportagem especial produzida pela Rádioagência Noticias do Planalto (http://www.radioagencianp.com.br/) afirma que este “aumento quase desordenado de instituições de ensino privadas comprova que este é um negócio mais lucrativo do que os setores de energia e telecomunicações. Segundo pesquisa divulgada pelo jornal Valor Econômico, os lucros das instituições de ensino superior privada se comparam ao das empresas como Vale, Gerdau e Petrobras. Em março de 2007, a Anhanguera Educacional S.A foi a primeira instituição de ensino superior da América Latina a investir na Bolsa de Valores, tendo obtido no primeiro dia de operações uma valorização de 70% de suas ações. Em seis meses, a Anhanguera captou R$ 512 milhões e seu número de alunos foi de 24 mil para 53 mil neste período”.


No final de novembro serão divulgados pelo INEP os números do censo de 2007. Espero que somadas as ampliações feitas em 2008, o segundo mandato de Lula seja capaz de estreitar o hiato entre público e privado, revertendo a tendência dos últimos anos.
Digo isso para não parecer pessimista, mesmo que a tarefa acima descrita seja de difícil execução. Sem uma mudança radical na política econômica é impossível estabelecer um volume de recursos que permita taxas de crescimento animadoras.
Como a crise econômica internacional atravessou o atlântico e aportou em solo brasileiro, o discurso de corte nos gastos públicos voltou a ganhar força, tornando mais remota a hipótese de chegarmos perto das metas do PNE em janeiro de 2011. Nesta data Lula deixa a presidência e o PNE completa 10 anos.

2 comentários:

Anônimo disse...

Mais uma vez, parabéns pelo seu Blog, sempre esclarecedor.
Abraço, Jorge Almeida.

Suzana Gutierrez disse...

Olá Luiz

Coheci teu blog hoje por meio deste artigo. Gostaria de te propor uma reflexão, considerando as políticas públicas, sobre o processo de inserção das tecnologias (TIC) no trabalho do professor e na escola.

E, juntamente com isso, uma olhada na proliferação dos cursos à distância, os quais majoritariamente são meramente de certificação.

abraços!