segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

O Capital

O capital tem horror à ausência de lucro.
Quando fareja um beneficio, o capital torna-se ousado.
A 20% fica entusiasmado. A 50% é temerário.
A 100% enlouquece a luz de todas as leis humanas
A 300% não recua diante de nenhum crime
Karl Marx – O Capital

Cursos universitários inferiores para os mais pobres

Vários veículos de comunicação noticiaram uma verdade fartamente denunciada pelas entidades educacionais: o Ministério permite que 67% dos cursos com piores notas no Enade ofereçam bolsas no Prouni.
Dos 96 cursos superiores de instituições particulares que obtiveram nota um - a mais baixa possível - no último Enade (Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes), 67% estão credenciados pelo MEC (Ministério da Educação) para oferecer bolsas de estudo a alunos de baixa renda no Prouni (Programa Universidade para Todos). É o que aponta um levantamento feito pela Agência Brasil. Da lista dos 127 cursos com nota 1 foram excluídas 31 universidades públicas que, por sua natureza, não fazem parte do programa.

Concordo plenamente com o depoimento do professor da USP (Universidade de São Paulo) Romualdo Oliveira, especialista em ensino superior, que acusa a lei que regula o programa de ser falha por não apresentar nenhuma exigência de desempenho mínimo dos cursos credenciados.
Na opinião do professor Oliveira, sem uma cláusula de barreira para garantir a qualidade do ensino oferecido aos alunos, o programa "vende gato por lebre". "Eu tenho uma crítica ao próprio programa, não acho que seja uma alternativa de viabilização de acesso ao ensino superior justamente porque subsidia cursos de má qualidade. Seria mais eficiente usar esses recursos para a expansão do ensino superior público, porque nesse há garantia de uma boa educação", defende.

Os representantes do MEC recomendam que os candidatos de bolsas no ProUni que procurem saber mais sobre a qualidade do curso antes de se inscrever. Ora, se o MEC já sabe quem ainda oferece cursos de má qualidade, por que não restringe o acesso ao oferecimento de bolsas pelo Prouni?
Como já postei aqui, a prioridade ministerial tem sido isentar de impostos em troca de vagas mais baratas ao invés de acelerar o ritmo de crescimento das vagas públicas. Agindo assim o MEC eterniza a primazia privada no ensino superior em nosso país.

sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Só pode ser o espírito natalino


No dia 7 de dezembro o ministro da educação, Fernando Haddad declarou-se crente de que a crise financeira mundial não diminuirá os investimentos em educação. Disse textualmente que “temos uma dívida educacional com o povo brasileiro e vamos investir nesse setor em qualquer época”.
A crença do ministro entra em choque com todas as previsões de desaceleração econômica feitas por economistas de esquerda e de direita. Parece mais uma reedição do discurso do presidente Lula no início da crise econômica mundial, que professava também uma firme crença em efeitos leves e indolores da crise mundial.
No último dia 19 foi aprovado o Orçamento da União para 2009 e a educação sofreu um corte de mais de um bilhão do que estava proposto, como parte do corte de 11 bilhões de custeio no total orçamentário. Além disso, foram refeitas as estimativas de desempenho da economia brasileira para o próximo ano, estimando de maneira otimista um crescimento do PIB da ordem de 3,5%. É bom registrar que a CEPAL trabalho com crescimento de apenas 2% para o Brasil e de 1,9% para o conjunto da América Latina.
Quanto mais a economia perde vigor, mais o consumo cai e devido a isso os principais tributos que sustentam a arrecadação federal, estadual e municipal diminuirão. Ou seja, a tendência é que tenhamos queda na arrecadação para 2009 e, obviamente, queda nos recursos vinculados a educação. Somente a projeção orçamentária de “Transferências a Estados, Distrito Federal e Municípios” encolheu 3,3 bilhões de reais.
As noticias da crise econômica não comportam otimismos exagerados, mesmo que movidos pelo clima natalino.

quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

Novos dias

Incorporando o espírito de final de ano reproduzo um poema de Sérgio Vaz.

"Este ano vai ser pior...
Pior para quem estiver no nosso caminho".

Então que venham os dias.
Um sorriso no rosto e os punhos cerrados que a luta não pára.
Um brilho nos olhos que é para rastrear os inimigos (mesmo com medo,
enfrente-os!).
É necessário o coração em chamas para manter os sonhos aquecidos.
Acenda fogueiras.
Não aceite nada de graça, nada. Até o beijo só é bom quando conquistado.
Escreva poemas, mas se te insultarem, recite palavrões.
Cuidado, o acaso é traiçoeiro e o tempo é cruel, tome as rédeas do teu
próprio destino.
Outra coisa, pior que a arrogância é a falsa humildade.
As pessoas boazinhas também são perigosas, sugam energia e não dão
nada em troca.
Fique esperto, amar o próximo não é abandonar a si mesmo.
Para alcançar utopias é preciso enfrentar a realidade.
Quer saber quem são os outros? Pergunte quem é você.
Se não ama a tua causa, não alimente o ódio.
Por favor, gentileza gera gentileza. Obrigado!
Os Erros são teus, assuma-os. Os Acertos Também são teus, divida-os.
Ser forte não é apanhar todo dia, nem bater de vez em quando, é
perdoar e pedir perdão, sempre.
Tenho más notícias: quando o bicho pegar, você vai estar sozinho. Não
cultive multidões.
Qual a tua verdade ? Qual a tua mentira? Teu travesseiro vai te dizer.
Prepare-se!
Se quiser realmente saber se está bonito ou bonita, pergunte aos teus
inimigos, nesta hora eles serão honestos.
Quando estiver fazendo planos, não esqueça de avisar aos teus pés, são
eles que caminham.
Se vai pular sete ondinhas, recomendo que mergulhe de cabeça.
Muito amor, mas raiva é fundamental.
Quando não tiver palavras belas, improvise. Diga a verdade.
As Manhãs de sol são lindas, mas é preciso trabalhar também nos dias de chuva.
Abra os braços. Segure na mão de quem está na frente e puxe a mão de
quem estiver atrás.
Não confunda briga com luta. Briga tem hora para acabar, a luta é para
uma vida inteira.
O Ano novo tem cara de gente boa, mas não acredite nele. Acredite em você.
Feliz todo dia!

São 70? 48? Ou apenas 40?

Os últimos dias foram muito confusos quando o assunto era a definição do Orçamento do MEC para 2009.
Uma semana atrás o ministro Fernando Haddad jurava que ficaria com 48 bilhões para a sua pasta. No dia seguinte a votação do Orçamento pelo Congresso Nacional, a maioria das agências de notícias deram destaque para o corte de 11 bilhões do custeio da máquina pública, sendo que 1,6 bilhão foi retirado do MEC. Nas citadas matérias falavam que o orçamento do MEC caiu de 70,5 bilhões para 69,5 bilhões.
Nem uma coisa nem outra. A previsão do ministro não se concretizou. Os dados divulgados pela imprensa estavam errados, ancorados que foram em números publicados no volume IV do Relatório Geral do Orçamento da União, mas que foram devidamente corrigidos.
A Proposta orçamentária enviada pelo governo federal propunha para o MEC o valor de R$ 41.560.934.226,00. Durante a tramitação no Congresso este valor chegou a R$ 41.860.847.226,00, mas foi atingido pela navalha do relator Senador Delcídio do Amaral (PT/MS) e caiu para R$ 40.521.756.350,00.
Isso quer dizer uma perda de 1,3 bilhão em relação ao que havia sido conseguido nos debates parlamentares. É verdade que na reta final da votação o relator negociou recuperar os recursos perdidos pela Educação e pela Ciência e Tecnologia por meio de uma incerta arrecadação de recursos da RFFSA, um dinheiro ainda virtual.
Comparando com o que foi autorizado em 2008 (R$ 34.159.331.025,00) o aprovado representa uma elevação de 18,6%.
Resta saber se isso é apenas um recurso virtual, para “inglês ver” ou efetivamente uma garantia de mais recursos para a educação. Vamos esperar o decreto de contingenciamento lá por março e o agravamento da crise (que só o presidente Lula acredita que não acontecerá) para não tirarmos conclusões precipitadas.

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Execução orçamentária continua baixa

Faltando treze dias para o final do ano e os dados de execução orçamentária do Ministério da Educação melhoram um pouco, mas não o suficiente para comemorar. Dados do SIGA Brasil coletados no dia 17 de dezembro mostram que o MEC executou apenas 75,9% do dinheiro que lhe foi destinado no Orçamento deste ano.
Os números mostram que programas fundamentais para minorar o caos educacional, especialmente na educação básica, continuam aquém do esperado. Atualizo os números de três programas:
Programa Brasil Escolarizado: sua dotação autorizada é de 7,8 bilhões, mas até agora só conseguiu executar 5,9 bilhões, ou seja, apenas 76,2%. Nos últimos 17 dias só conseguiu gastar mais 300 milhões. O seu desempenho continua atrelado aos repasses obrigatórios da complementação da União para o Fundeb, cujo desembolso representa 47,6% do aplicado no programa.
Programa Qualidade na Escola: com dotação autorizada de 1 bilhão, o que já não é muito, tem um desempenho de apenas 36,4% de execução. Concentrados em três ações (infra-estrutura da rede física, transporte e uma ação denominada apoio ao desenvolvimento da educação básica, na qual cabe qualquer coisa que seja necessário apoiar. O que no discurso aparece como prioridade não se consolida na execução orçamentária.
Programa Brasil Alfabetizado: para enfrentar o desafio de alfabetizar 10 milhões de brasileiros (segundo PNAD 2007), este programa dispunha de 351 milhões, mas só foram autorizados 309 milhões e até agora conseguiu gastar apenas 200 milhões, ou seja, apenas 64,6% do autorizado. Consolida-se um péssimo desempenho diante de tão grave problema.
Programa Educação para a Diversidade e a Cidadania: sua dotação orçamentária é de 85 milhões, mas foram autorizados apenas 68 milhões e até 17 dezembro a sua execução foi de apenas 10,7 milhões, ou seja, de apenas 15,6%.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Acerca da gravidade da crise mundial


"A desconfiança é total. O mercado interbancário não funciona e se geram círculos viciosos: os consumidores não consomem, os empresários não contratam, os investidores não investem e os bancos não emprestam. Há uma paralisação quase total, do qual nada escapa"

(Miguel Angel Fernández Ordoñez – presidente do Banco Central da Espanha)

Que inveja!

Neste sábado (20 de dezembro) a UNESCO declarou a Bolívia como território livre do analfabetismo. Em nosso continente somente Cuba e Venezuela conseguiram este atestado.
"Missão cumprida diante do povo boliviano e do mundo inteiro", exclamou o presidente da Bolívia, Evo Morales, ao lembrar que "erradicar o analfabetismo" sempre foi um de seus objetivos desde que era candidato.
A Bolívia utilizou o método audiovisual cubano "Eu posso" e contou com apoio financeiro da Venezuela e de Cuba. Em 33 meses alfabetizou quase 820 mil pessoas, ou seja, cerca de 10% da população.
O programa de alfabetização, que Morales transformou em um assunto de Estado, recebeu a doação de 3.000 televisores e videocassetes de Cuba, além de 8.000 painéis geradores de energia para que se pudesse chegar à área rural.
Durante a cerimônia o ministro venezuelano de Educação, Héctor Navarrona, declarou que seu país, Cuba e a Bolívia estão dispostos a ajudar Paraguai e Nicarágua a erradicar o analfabetismo, sendo que este esforço faz parte do fortalecimento da Alba (Alternativa Bolivariana das Américas).
O presidente paraguaio, Fernando Lugo, esteve presente e fez uma declaração muito interessante. Ele disse: "Quando cada paraguaio, cada boliviano, cada argentino e cada brasileiro puder escrever com próprio punho a história de seu futuro ninguém mais poderá roubar deles a esperança".
Concordo integralmente com o presidente paraguaio. O combate ao analfabetismo deu certo na Nicarágua no período da Revolução Sandinista (1979), foi erradicado em Cuba (pela Revolução Socialista) e na Venezuela (pela determinação bolivariana de Chávez). E certamente será erradicado novamente na Nicarágua, mesmo que o governo atual de Ortega não seja nem a sombra do que foi durante a Revolução Sandinista e, pela disposição de Fernando Lugo, poderá ser erradicado do Paraguai.
O investimento para erradicar 820 mil pessoas em 33 meses foi de 36 milhões de dólares. Pela cotação do dólar (2,36) chegamos a 84,9 milhões de reais.
O Brasil está longe de erradicar o seu analfabetismo e isso tem várias explicações possíveis:
1ª. Erradicar o analfabetismo não se tornou uma política de Estado e nem prioridade política de governo;
2ª. Não se tornou um movimento social capaz de empolgar milhares de jovens e educadores. Talvez por que o próprio governo Lula, com sua política econômica conservadora, não empolgue o coração e as mentes para além do apoio eleitoral que recebe;
3ª. Os recursos não são suficientes e não são gastos com eficiência.
Sei perfeitamente que a inveja não é um sentimento nobre, mas sinto inveja do povo boliviano.

sábado, 20 de dezembro de 2008

Prorrogado prazo para recadastramento dos conselhos do Fundeb


No dia 2 de janeiro os novos secretários de educação vão encontrar enormes desafios pela frente. Deles me ocuparei em outras postagens. Por enquanto reforço um alerta importante.
O FNDE decidiu prorrogar para 28 de fevereiro de 2009 a data-limite de recadastramento dos conselhos de acompanhamento e controle social do Fundo da Educação Básica (Fundeb). O prazo, que terminaria no último dia 12, foi ampliado para não prejudicar estados e municípios. O não-preenchimento do cadastro pode levar à suspensão do repasse financeiro para o transporte escolar.
O acesso ao sistema está disponível na página eletrônica do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). O cadastro reunirá informações precisas sobre a criação e a composição dos conselhos, responsáveis pelo acompanhamento e controle da distribuição, transferência e aplicação dos recursos do Fundeb. Cabe também a eles monitorar a execução do Programa Nacional de Apoio ao Transporte Escolar (Pnate) e dar parecer sobre a prestação de contas de cada estado e município que recebeu recursos do programa.
O cadastramento no novo sistema é indispensável para a concessão e a manutenção do apoio financeiro da União ao transporte escolar rural.
Os recursos oriundos do PNATE são essenciais para a manutenção do transporte escolar, mesmo que não sejam suficientes. Aliás, garantir o transporte escolar de qualidade é um dos desafios dos novos dirigentes municipais de educação.
A obrigação de fazer o cadastro é de estados e municípios. Os códigos de acesso ao sistema foram enviados às secretarias estaduais e municipais de educação no início de outubro. Como estamos em momento de transição de governo, é bom que os atuais secretários municipais não esqueçam de repassar os referidos códigos aos seus sucessores.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

De novo o risco da desvinculação

Reproduzo alerta feito pela Campanha Nacional pelo direito a Educação sobre a possibilidade de aprovação na reforma tributária de uma desvinculação das receitas dos estados, proposta danosa para as políticas públicas, especialmente para educação e saúde.

“O relator da comissão especial da reforma tributária, deputado Sandro Mabel (PR-GO), já promete retirar o mecanismo que cria a DRE (Desvinculação de Receitas dos Estados e Distrito Federal) de seu substitutivo à PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 233/2008, da reforma tributária, aprovado no dia 20 de novembro. Segundo análise da CNM (Confederação Nacional de Municípios), o dispositivo proposto pelo relator pode diminuir em cerca de R $ 8 bilhões o investimento em áreas sociais só em 2010, quando a reforma entraria em vigor.
De acordo com o coordenador da área de estudos técnicos da CNM, Eduardo Stranz, só na educação, a perda estaria no patamar de R$ 3,6 bilhões. Desse montante, R$ 2 bilhões deixariam de ser remetidos a MDE (Manutenção e Desenvolvimento da Educação) e R$ 1,6 bilhões ao Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica). Diante disso, o relator já estuda a possibilidade de abandonar a proposta. “A idéia é me reunir com a bancada da educação e da saúde para retirarmos este dispositivo. Temos conversado com os parlamentares a respeito e a avaliação é que realmente deva ser retirado”, declarou Mabel à Campanha.
O dispositivo é contraditório a outra proposta que tramita na Câmara: a PEC 277/2008, que se aprovada pode por fim à DRU (Desvinculação das Receitas da União). “[ADRE] não faz sentido, a mobilização é para restabelecer as vinculações”, afirmou o consultor legislativo da Câmara dos Deputados, Paulo Sena Martins, referindo-se à PEC 277. Ele alerta para o fato de que se a DRE não for retirada da reforma tributária pode abrir um precedente perigoso para as áreas sociais. “Daqui a pouco vai haver reivindicações feitas pelas secretarias municipais da fazenda”, completou
Como funcionam a DRU e a DRE– A DRE prevê aos estados a possibilidade de descontar das vinculações a que estão submetidos pela Constituição porcentagens de sua arrecadação do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), de acordo com a parcela no PIB (Produto Interno Bruto) nacional que seu PIB local representa. São Paulo, por exemplo, que possui mais que 25% de participação no PIB nacional, pode retirar 0,5% do ICMS que aplica em áreas sociais, ao passo que estados como o Acre, com uma proporção inferior a 1,5% do PIB nacional, estariam autorizados a desviar 12%. Há ainda outras quatro faixas intermediárias que permitem o abatimento de 1,4%, 2%, 3,5% e 5%. O ICMS é uma das principais fontes para o financiamento do MDE e do Fundeb.

Já a DRU foi criada em 1994 pelo governo FHC como Fundo Social de Emergência. Virou Fundo de Estabilização Fiscal e desde 2000, Desvinculação das Receitas da União. Ano passado a manobra foi prorrogada até 2011. A DRU permite à União desvincular 20% de todos os impostos e contribuições federais para gastar livremente. A PEC 277 visa acabar com a incidência do dispositivo exclusivamente na educação. Isso significa a manutenção de algo em torno de R $ 7 bilhões de investimentos na área por ano. A matéria está sendo analisada por uma Comissão Especial na CEC (Comissão de Educação e Cultura) da Câmara, sob relatoria do deputado Rogério Marinho (PSB-RN), e só deve ter andamento em 2009”.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Qualidade. Que qualidade?


Ontem (17.12) o STF acolheu parcialmente a Ação Direta de Inconstitucionalidade impetrada por cinco governadores contra a Lei nº 11.738/08 que estabeleceu o piso salarial nacional para os profissionais do magistério.
As manchetes dos jornais no dia de hoje passam a impressão de que os governadores foram derrotados. Não concordo com essa avaliação.
No site do STF está dito o seguinte:

Os ministros definiram que o termo "piso" a que se refere a norma em seu artigo 2º deve ser entendido como a remuneração mínima a ser recebida pelos professores. Assim, até que o Supremo analise a constitucionalidade da norma, na decisão de mérito, os professores das escolas públicas terão a garantia de não ganhar abaixo de R$ 950,00, somados aí o vencimento básico (salário) e as gratificações e vantagens. Esse entendimento deverá ser mantido até o julgamento final da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4167.
A seguir, por maioria, os ministros concluíram pela suspensão do parágrafo 4º do artigo 2º da lei, que determina o cumprimento de, no máximo, 2/3 da carga dos magistrados para desempenho de atividades em sala de aula. No entanto, continua valendo a jornada de 40 horas semanais de trabalho, prevista no parágrafo 1º do mesmo artigo. A suspensão vale, também, até o julgamento final da ação pelo STF.
Por fim, os ministros reconheceram que o piso instituído pela lei passa a valer já em 1º de janeiro de 2009
.(grifos meus)

É verdade que o que foi julgado foi uma ADIN contra toda a lei do piso. Os governadores questionam basicamente o fato de que o piso será calculado sobre o vencimento base a partir de janeiro de 2010 e de estar estabelecido 33% de hora-atividade para os docentes. Na verdade o principal alvo dos governadores é evitar o impacto da elevação do percentual de hora-atividade na folha de pagamento.
O STF manteve o piso, mas atendeu plenamente os interesses dos governadores. Remete para a legislação estadual e municipal a definição da carga horária dos docentes e sua divisão entre horas destinadas a aulas propriamente ditas e o percentual destinado a planejamento e estudos. E também autoriza calcular o piso sobre a remuneração, como a lei atual estabelecia apenas para 2009. Isso tudo até o julgamento do mérito, que obviamente ninguém é capaz de prever a data, podendo o julgamento durar anos.
Estudo encomendado pelo Conselho Nacional dos Secretários Estaduais de Educação levantou o impacto da implantação da nova carga horária para atividades de planejamento. O estudo encontrou a necessidade de contratação de 222 mil novos professores, que custaria 3 bilhões e 500 milhões no próximo ano. Este impacto é obviamente maior naqueles estados onde inexiste hora-atividade ou ela é residual. Recentemente os professores entraram em greve no Rio Grande do Sul contra projeto de lei enviado pela governadora Yeda Crusius, que não cumpria a lei do piso. Este estado possui hora-atividade de 20% da carga horária, porém no decorrer do tempo foi contratando professores temporários que não possuem este direito. Esta esperteza aumentou o impacto atual de implantação da medida.
No momento em que tanto se fala de qualidade, a decisão do STF, ao contrário do que possa parecer, não foi salomônica. Como o valor do piso é muito rebaixado e a legislação permite calcular o seu valor em 2009 sobre toda a remuneração, o que o STF fez foi conceder aos governadores o aval para manter as jornadas atuais e diminuir o impacto do piso na vida dos professores.
O mais interessante é que o governo federal não comentou a decisão. Silenciou sobre um aspecto essencial para qualquer projeto de melhoria da qualidade educacional. Sem hora para planejamento é impossível implementar qualquer proposta séria na área pedagógica, pois os professores precisam ter tempo para discutir entre si a situação de cada aluno, planejar ações pedagógicas conjuntas e avaliar os resultados. As mudanças pedagógicas acontecem no ambiente da escola e não apenas mandando os professores para cursos e palestras.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Juros da dívida 15 X Educação 2

O meu amigo Rodrigo Ávila, assessor da bancada federal do PSOL e militante do movimento por uma auditoria da dívida pública no Brasil, produziu contundente análise sobre o relatório do Senador Delcidio Amaral (PT/MS), que provavelmente será votado no dia de hoje. Reproduzo abaixo alguns trechos:

"Assim como nos anos anteriores, o Projeto de Lei Orçamentária para 2009 prioriza o pagamento da dívida pública, em detrimento dos gastos sociais. O quadro da página seguinte mostra que os compromissos com a dívida significam nada menos que quase a metade (48%) do orçamento total, sendo 33% com a rolagem da dívida (ou seja, o pagamento de amortizações feito por meio da emissão de novos títulos) e 14,91% de gastos com juros e amortizações pagas em dinheiro.
Os gastos com o refinanciamento da dívida devem também ser considerados, uma vez que eles obrigam o governo a ter de se submeter sistematicamente às imposições do mercado para tomar novos empréstimos, para poder pagar os títulos que estão vencendo. E agora, num contexto de crise financeira, os bancos privados e os especuladores nacionais e estrangeiros já estão exigindo juros mais altos e prazos mais curtos para rolar a dívida, razão pela qual é inadmissível e extremamente temerário o país ter de rolar nada menos que R$ 522 bilhões no ano que vem. Isto significa R$ 43,5 bilhões rolados por mês, quase um orçamento inteiro da saúde para 2008, que deverá ser refinanciado a cada mês de 2009.
Mesmo sem considerar o refinanciamento, ou seja, a rolagem da dívida, verificamos que os gastos com juros e amortizações da dívida representam mais de 4 vezes os valores programados para a saúde, 6 vezes os gastos com Educação, mais de 7 vezes os recursos para a Assistência Social, 36 vezes os gastos com Segurança Pública, 42 vezes os recursos para Reforma Agrária, 57 vezes os recursos com Gestão Ambiental, 106 vezes os recursos do Saneamento, 148 vezes os gastos com Direitos da Cidadania, 171 vezes os recursos do Desporto e Lazer, 175 vezes os recursos para habitação, 186 vezes a Cultura, e 282 vezes a Energia.
Cabe aqui denunciar também os cortes de gastos sociais feitos segunda feira pelo Relator, para adequar o orçamento à redução na arrecadação, devido à crise financeira. Ao invés de cortar os abundantes gastos com o endividamento, o relator preferiu adiar a contratação de pessoas já aprovadas em concurso, além de cortar gastos essenciais ao funcionamento dos serviços públicos, tais como diárias e passagens. Programas como o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci) também sofrerão cortes. O governo também afirmou que irá vetar as emendas aprovadas por este Parlamento na semana passada, que atenderam aos pleitos dos servidores do IPEA e da Previdência Social".

Pelos dados apresentados por Rodrigo podemos verificar que gastos com juros e amortização da dívida consumirão 14,9% enquanto gastos com saúde apenas 2,3%.
A crise se aprofunda e o governo faz a opção de penalizar os mais pobres, justamente aqueles que precisam dos serviços públicos oferecidos pelo Estado Brasileiro.

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

A avenida paulista substituiu o Congresso Nacional


Na avenida mais representativa da elite econômica está situada a sede do movimento Todos pela Educação. Este movimento se auto-define como “uma aliança da sociedade civil, da iniciativa privada, de organizações sociais, de educadores e de gestores públicos da Educação” e é presidido pelo empresário Jorge Gerdau Johannpeter.
Em nome de sensibilizar sociedade e governo para a melhoria da educação básica em nosso país, este movimento estabeleceu cinco metas que o país deve alcançar até 2022.

Meta 1: Toda criança e jovem de 4 a 17 anos na escola
Meta 2: Toda criança plenamente alfabetizada até os 8 anos
Meta 3: Todo aluno com aprendizado adequado à sua série
Meta 4: Todo jovem com o Ensino Médio concluído até os 19 anos
Meta 5: Investimento em Educação ampliado e bem gerido


Semana passada foi lançado o primeiro relatório de acompanhamento das
5 Metas do movimento Todos Pela Educação, que recebeu o nome “De olho nas metas”. A equipe técnica que foi responsável pela produção do material é coordenada por Viviane Senna, do instituto que homenageia o famoso esportista Airton Senna.
No documento podemos encontrar a justificativa para o estabelecimento das metas. É afirmado que a “Comissão Técnica do Todos Pela Educação reuniu reconhecidos especialistas em Educação e em áreas relacionadas constituindo, assim, o grupo que assumiu a importante tarefa de definir indicadores e metas para a Educação brasileira”.
Bem, antes de comentar o mérito das metas e os resultados encontrados no monitoramento que este estudo apresenta, vale discutir dois aspectos essenciais da questão.
O primeiro diz respeito à legitimidade do movimento para recrutar especialistas e definir indicadores para a educação brasileira. Não tive conhecimento que o povo brasileiro, seja por via direta ou por intermédio de seus representantes eleitos, tenha delegado tal tarefa a uma organização composta de ricos empresários e técnicos alinhados com determinada visão de mundo, a tarefa que desenvolveram.
O segundo aspecto é que a legislação brasileira educacional é nítida sobre a responsabilidade por tal tarefa. Basta uma leitura rápida da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional para verificar que cabe à União, dentre outras obrigações, a tarefa de coletar, analisar e disseminar informações sobre a educação e de assegurar processo nacional de avaliação do rendimento escolar no ensino fundamental, médio e superior, em colaboração com os sistemas de ensino, objetivando a definição de prioridades e a melhoria da qualidade do ensino.
Além da União temos também a Comissão de Educação da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, instâncias parlamentares que possuem a obrigação de monitorar o fiel cumprimento da legislação e da política educacional, inclusive as metas e diretrizes do Plano Nacional de Educação.
A julgar pela estreita colaboração que o MEC ofereceu a produção dos indicadores do movimento Todos pela Educação, transparece o fato de que está ocorrendo uma terceirização voluntária e acordada de tarefas de governo e, ao mesmo tempo, uma usurpação de atribuições do Congresso Nacional.
Infelizmente não estamos assistindo a um aumento do controle social sobre as políticas públicas. Para isso seria necessário que o movimento em questão fosse representativo das maiorias excluídas das decisões nacionais. Se isso fosse verdade, certamente a sua presidência não seria do dono de uma multinacional, nem seu conselho seria composto por tantos expoentes da elite econômica brasileira.
E mais, este ano foi realizada uma Conferência Nacional da educação básica, precedida de debate nos estados. Também não foi neste espaço que os educadores delegaram a tarefa de monitoramento para este seleto grupo.
Além disso, constitui um bom exercício verificar que a comissão técnica escolhida para monitorar em nome do povo brasileiro o desempenho da educação básica. Lá estão nomes que prestaram relevantes serviços ao governo FHC ou que ajudaram a construir a concepção neoliberal que se tornou hegemônica em nosso país na década de 90 e, infelizmente, não foi questionada nem desconstruída pelo governo Lula. Cito apenas a senhora Claudia Costin, que foi Ministra de Administração e Reforma do Estado, a senhora Maria Helena de Castro, ex-toda poderosa presidente do INEP na gestão Paulo Renato e atual secretária de educação de São Paulo, a senhora Mariza Abreu, secretária de educação do Rio Grande do Sul, a senhora Raquel Teixeira, ex-secretária de educação de Goiás e ex-deputada federal pelo PSDB, e para não alongar muito a lista, o senhor Ruben Klein, consultor da Fundação Cesgranrio, entidade responsável pela idealização e aplicação dos principais instrumentos de avaliação em larga escala implantados no governo FHC.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Todo apoio a Zaidi


No dia de ontem (14.12) um jornalista iraquiano jogou hoje seus sapatos contra o presidente americano, George W. Bush, durante uma entrevista coletiva realizada em Bagdá junto ao primeiro-ministro iraquiano, Nouri al-Maliki.
O nome do jornalista é Mountazer Zaidi, do canal sunita e antiamericano Al-Bagdadia, cuja base de transmissão é no Cairo, foi retirado à força pelos agentes do serviço de segurança do Iraque e dos EUA, aos gritos de "você (Bush) é responsável pela morte de milhares de iraquianos".
No Iraque, como em grande parte do mundo árabe, jogar um sapato é uma das maiores ofensas que se pode cometer contra outra pessoa, da mesma forma que chamá-lo "cão".
Ele jogou os dois sapatos, mas infelizmente ele errou o alvo e em seguida foi preso.
Quero dizer que o jornalista Zaidi fez um gesto muito arriscado, mas representativo do desejo da maioria do povo do planeta Terra.
O atual presidente do Império do Norte mereceu o tratamento dado pelo jornalista Zaidi. Ele promoveu a invasão do Iraque e ordenou a morte de milhares de árabes, só para controlar as reservas estratégicas de petróleo daquele país.
George Bush reativou a temida Quarta Frota, reeditando a conduta de seus antecessores do inicio do século passado, quando a América Latina era quintal do poderoso EUA.
Milhões de seres humanos estão sem emprego neste momento porque eclodiu uma grave crise econômica mundial, cujo epicentro é justamente a desregulamentação econômica promovida por este senhor.
Zaidi fez o que milhões gostariam de ter feito. Só por isso merece nosso respeito e admiração.

sábado, 13 de dezembro de 2008

Triste lembrança


Há quarenta anos era editado o Ato Institucional nº 05. O escritor Zuenir Ventura construiu uma feliz representação sobre a reunião do Conselho de Segurança Nacional que decidiu pela sua edição.


“Os personagens reais eram suas próprias caricaturas, e o choque entre o que se propunha e as razões pelas quais se dizia aceitar o proposto era um jogo de cinismo que nenhuma transposição dramática conseguiria superar”.


O AI-5 marca a fase mais repressora da ditadura militar no Brasil. Em dez anos de vigência foram punidos 1607 cidadãos, dos quais 321 cassados: 6 senadores, 110 deputados federais e 161 estaduais, 22 prefeitos, 22 vereadores – mais de 6 milhões de votos anulados. Todos tiveram seus direitos políticos suspensos por dez anos.
Foi a senha para a mais cruel repressão aos grupos de esquerda no país. Milhares foram presos, torturados, centenas desapareceram e seus corpos nunca foram encontrados.
Ao contrário de outros países latino-americanos, o Brasil até hoje não ajustou as suas contas com o período de ditadura. Os torturadores não foram punidos e vez ou outra aparecem nos jornais recordando os tempos em que estavam na ativa.
Havia uma expectativa de que o governo Lula cumprisse esta tarefa, mas até o momento a postura governamental tem sido vergonhosa sobre o assunto, com exceção de algumas manifestações ministeriais, que de tão isoladas apenas justificam a regra.
A lembrança de 40 anos deste triste episódio é uma boa oportunidade para uma mudança de atitude do atual governo. Queremos saber a verdade, ter acesso aos documentos que nunca foram mostrados ao povo brasileiro, saber onde estão enterrados os militantes do PCdoB mortos nas matas do Araguaia.
Queremos que o crime de tortura e assassinato não seja perdoado e que seus autores sejam finalmente punidos.
O escritor José Saramago afirma que a cegueira também é isso, viver num mundo onde se tenha acabado a esperança. Passados quarenta anos é hora do povo brasileiro não aceitar a manutenção da impunidade.
Com a palavra o presidente Lula.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Destinatário errado


No dia 26 de novembro foi entregue ao Presidente Lula uma carta propondo uma série de medidas de combate à crise econômica. O texto é assinado por sessenta entidades do movimento social. Na lista constam as maiores centrais sindicais, as entidades estudantis e do movimento popular, além do MST e Via Campesina.
Basicamente a carta propõe que Lula deixe de ser Lula e comece um novo governo. Diz textualmente que “devemos aproveitar a brecha da crise para mudar a política macroeconômica de natureza neoliberal, e ir construindo um novo modelo de desenvolvimento nacional, baseado em outros parâmetros, sobretudo na distribuição de renda, na geração de emprego e no fortalecimento do mercado interno”. Na verdade o texto da carta esconde um subtexto. Os movimentos sociais que subscrevem a carta ainda acreditam que há espaço para disputa de rumos do governo Lula. Ou seja, depois de seis anos de convivência com um governo que implementa uma “política macroeconômica de natureza neoliberal”, ainda acreditam que Lula poderá ser convencido a mudar de rumo, mesmo que estes rumos lhe ofereçam uma ampla base de acordos com o grande capital, com a mídia e com os conglomerados internacionais.
Acontece que Lula age na direção contrária das propostas apresentadas. Cito alguns exemplos significativos.
A carta propõe “o fortalecimento da estratégia de integração regional, que se materializa a partir dos mecanismos como: Mercosul, Unasul e Alba” e do Banco do Sul “para impedir a especulação dos bancos, do FMI, e dos interesses do capital dos Estados Unidos”. Nada mais distante da política externa do governo Lula, que reage de forma violenta a cada questionamento feito por países vizinhos as ilegalidades praticadas por multinacionais de origem brasileira, que segue a cartilha do FMI, que não investe na Alba e põe obstáculos para a constituição do Banco do Sul como alternativa as agências internacionais existentes.
A carta propõe acertadamente que seja reduzida “imediatamente as taxas de juros” e que se imponha “um rigoroso controle da movimentação do capital financeiro especulativo”. O governo Lula mantém Henrique Meireles, representante-mor do capital financeiro, a frente do Banco Central, não mexe uma palha para baixar os juros e libera vultosos recursos para salvar os especuladores.
Os movimentos sociais querem que seja revista a política de manutenção do superávit primário e que os recursos do superávit primário sejam utilizados para fazer volumosos investimentos governamentais, na construção de transporte publico e de moradias populares para a baixa renda”. Tenho total concordância com esta proposta, mas acontece que Lula quer aumentar ainda mais o superávit primário. Até 1º de dezembro nada mais nada menos do que 45% do suado dinheiro pago pelos cidadãos por meio dos impostos foi drenado para refinanciar a dívida pública interna e externa.
Afirmam que “o governo federal não pode usar dinheiro público para subsidiar e ajudar a salvar os bancos e empresas especuladoras” e que “os bancos públicos (BNDES, Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil) deveriam estar orientados não para socorrer o grande capital e sim para o benefício de todos os povos”. Nada mais distante das medidas concretas implementadas pelo governo Lula. As primeiras Medidas Provisórias editadas para enfrentar a crise, somadas as portarias e medidas administrativas do Banco Central, foram na direção de proteger os bancos, os especuladores e as empresas que apostaram na especulação.
Para não alongar demais a lista cito um último aspecto. Os movimentos acertadamente apresentam como reivindicação a realização de uma “auditoria integral da dívida pública para lançar as bases técnicas e jurídicas para a renegociação soberana do seu montante e do seu pagamento, considerando as dívidas histórica, social e ambiental das quais o povo trabalhador é credor”. Quem ouviu ou leu os pronunciamentos do ministro Amorim acerca das contendas com o Equador e Paraguai não tem dúvida de que a posição de Lula é de manter distância de qualquer investigação sobre a origem, legalidade e legitimidade do enorme endividamento do país.
Considero, portanto, que está na hora do conjunto do movimento social abandonar as restantes esperanças de disputa pelos rumos muito bem delineados do governo Lula. Como nada do que foi proposto pela carta faz parte do programa real do atual governo, nem tem guarita na base social real que interessa ao governo dialogar (no caso banqueiros, grandes empresários nacionais e internacionais), cabe ao movimento social tomar a decisão mais importante dos últimos tempos: deixar de lado as ilusões e colocar o nosso povo trabalhador em movimento, única forma de evitar que o ônus da crise econômica seja jogado nas costas do povo brasileiro.
Toda crise representa uma oportunidade, como bem disse o presidente Lula. Espero que esta sirva para fazer acordar o movimento social. Que os apoios dados pelo governo as estruturas sindicais, estudantis e sociais não tenham peso maior nas decisões do que os compromissos históricos com as classes trabalhadoras e com milhões de despossuídos que vivem em nosso querido país.
A carta foi enviada pro destinatário errado. Ela constitui um bom começo de uma plataforma unitária de luta contra a crise.

Maior transparência

Um dos problemas do ensino superior brasileiro é a fragilidade da fiscalização pública sobre as instituições privadas.
Semana passada a Comissão de Educação e Cultura da Câmara Federal aprovou por unanimidade Projeto de Lei 2491/2007 do deputado Ivan Valente (PSOL/SP) que obriga instituições de ensino superior a prestar informações, como carga horária e titulação dos docentes, aos estudantes a cada início de ano letivo.
É uma excelente iniciativa. O Projeto tenta coibir a burla feita pelas instituições no que diz respeito ao quadro de pessoal lotado na instituição.
Segundo o deputado Ivan Valente (PSOL/SP) , grande parte das instituições descumprem as exigências da lei do MEC no que diz respeito ao seu credenciamento, funcionamento e reconhecimento.
A legislação determina que no quadro de profissionais docentes exista 25% com titulação de mestre e 15% de doutor. Mas nem sempre essa regra é cumprida. Além disso, o rodízio de professores representa um expediente de mercado eficiente para as instituições de ensino, já que o salário da categoria perde valor, e prejuízo para os universitários, que tem impacto negativo na qualidade do ensino.
Outro problema destacado pelo deputado é que muitas instituições se utilizam da titulação do docente para obter ou manter o reconhecimento do curso junto ao MEC, e logo depois demitem o profissional.
O Projeto de Lei 2491/2007 determina a publicação e divulgação para os estudantes da lista de seus cursos, das disciplinas da grade curricular de cada curso, do seu corpo docente, sua titulação e tempo em que atua na instituição. O PL será analisado, em caráter conclusivo, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Onze pecados das fundações


A auditoria do TCU achou muita coisa errada nas fundações investigadas. Para os ministros Aroldo Cedraz e Raimundo Carreiro o conjunto de achados “revela a persistência e a vitalidade das distorções que corroem, com maior ou menor intensidade, os pilares do marco regulatório preconizado pela Lei nº 8.958/1994” e resumem os principais pecados encontrados:

1º. A prática da contratação direta de fundações de apoio tem subvertido as hipóteses de dispensa de licitação previstas no art. 1º da lei de regência, em especial pelo uso elástico do conceito de desenvolvimento institucional;
2º. A fiscalização exercida pelas curadorias de fundações dos ministérios públicos estaduais é frágil;
3º. Ainda encontraram contratação de fundações de apoio não credenciadas no MEC/MCT por universidades federais;
4º. As fundações de apoio, em regra, não têm observado os procedimentos previstos na Lei nº 8.666/93 nas contratações por elas efetivadas em projetos desenvolvidos com esteio na Lei nº 8.958/1994;
5º. São frágeis, quando não inexistentes, os mecanismos de transparência e de prestação de contas dos contratos/convênios firmados pelas IFES com suas fundações de apoio;
6º. Os achados evidenciaram a debilidade do controle finalístico e de gestão das fundações de apoio pelas instituições apoiadas e a ausência de regras claras de relacionamento que possibilitem a efetividade deste controle;
7º. Os gestores têm desprezado as deliberações emanadas dos órgãos de controle interno e externo;
8º. Os requisitos de participação dos servidores das instituições federais contratantes têm sido desvirtuados pela alocação continuada de servidores das IFES em projetos, com a percepção perene de bolsas e a caracterização de contraprestação de serviços;
9º. O pessoal contratado para os projetos tem sido muitas vezes deslocado para o exercício de atividades permanentes ou inerentes aos planos de cargos das IFES, configurando a terceirização irregular de serviços (burla à licitação) e a contratação indireta de pessoal (burla ao concurso público);
10º. O instituto do ressarcimento pelo uso de bens e serviços próprios da instituição federal contratante tem sido constantemente solapado pelo estabelecimento de percentuais fixos de remuneração e pela retenção de valores em contas privadas das fundações de apoio (fundos de apoio institucional);
11º. Persiste a prática irregular de empenho de recursos para fundações de apoio, com dispensa de licitação, com o objetivo de assegurar a execução de recursos transferidos intempestivamente para as IFES ao final do exercício financeiro.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

O lado de baixo do iceberg




As fundações de apoio às instituições de ensino superior são fundações de direito privado, submetidas às regras de direito civil, sem fins lucrativos.
O relatório de fiscalização do TCU lembra que as fundações de apoio apareceram no cenário nacional ainda na década de 70. Oficialmente o “objetivo precípuo das universidades brasileiras na contratação dessas entidades era assegurar maior autonomia administrativa, sobretudo na gestão de atividades de pesquisa”.
Por serem pessoas jurídicas de direito privado, as fundações propiciavam maior flexibilidade na gestão de compras, importações, contratação de pessoal celetista e prestação de contas.
Acontece que o incremento das fundações está intimamente relacionado ao processo de corte de verbas públicas para as universidades federais. Assim, durante a década de 90 as fundações transformaram-se “em veículos de captação de recursos fora dos orçamentos das universidades, destinados, sobretudo, à complementação salarial de servidores e ao reforço dos escassos orçamentos dos departamentos universitários”.
Há mais de quatro anos o ANDES-Sindicato advertia que as fundações se fortaleceram na medida em que o Estado se descomprometia com o financiamento da educação pública, transferindo à iniciativa privada o papel que deixava de cumprir. E concluía afirmando que as fundações além “de colaborar com a privatização do ensino público, a atuação dessas fundações compromete a liberdade acadêmica, direcionan­do a formatação de cursos, currículos, pesquisas etc. para atender aos interesses do mercado em detrimento das demandas sociais”.
Hoje, segundo o Portal da SESu/MEC, existem no Brasil 60 IFES (55 universidades, 1 faculdade e 4 Centros de Educação Tecnológica) e 111 fundações de apoio com credenciamento válido junto ao MEC/MCT.
Além dos cortes orçamentários, as IFES sofrem com a política de contingenciamento do governo federal, que libera recursos somente no último mês do ano, tornando difícil a sua execução. As reitorias repassam vultosos recursos para suas fundações para não devolver os recursos liberados, aumentando ainda mais o problema. Dados publicados pelo TCU mostram um crescimento deste fenômeno nos últimos anos. Em valores atualizados, estes repassem subiram de 601 milhões em 2002 para 1,4 bilhão em 2007, ou seja, um crescimento de 137,5%.

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

TCU fecha cerco sobre fundações


No início deste mês o Tribunal de Contas da União aprovou o ACÓRDÃO Nº 2731/2008, que indica um conjunto de medidas que as Universidades Federais devem tomar para sanar irregularidades envolvendo suas fundações de apoio.
Em Fiscalização de Orientação Centralizada (FOC) foram auditados 464 convênios e contratos, envolvendo um montante de 950 milhões de reais.
Ao todo, o TCU realizou 14 auditorias entre julho e setembro de 2008, encontrando diversas irregularidades. Foram inspecionadas a UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), Ufop (Universidade Federal de Ouro Preto), UFRRJ (Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro), UFF (Universidade Federal Fluminense), UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), UFPR (Universidade Federal do Paraná), UFG (Universidade Federal de Goiás), UFRR (Universidade Federal de Roraima), Ufam (Universidade Faderal do Amazonas), UFAC (Universidade Federal do Acre), UFC (Universidade Federal do Ceará), UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte), UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) e UFBA (Universidade Federal da Bahia).
O TCU (Tribunal de Contas da União) determinou que, em 180 dias a contar a partir de 1º de dezembro, todas as Instituições Federais de Ensino Superior implementem medidas para corrigir as irregularidades encontradas em contratos e convênios celebrados com suas fundações de apoio.
Ainda está fresca na memória do povo brasileiro o escândalo vivido pela Universidade de Brasília no mês de abril deste ano. O estopim foi a descoberta de gastos milionários na reforma do apartamento onde residia o então reitor Timothy Mullholand. Tudo financiado por dinheiro arrecadado pela FINATEC (Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos). Este escândalo revoltou os estudantes, provocou a queda do reitor e de outros ilustres dirigentes na UnB.
O que poderia parecer um ato isolado, ou seja, um desvio de conduta de um reitor é apenas a ponta de um enorme iceberg denominado Fundações de Apoio.
O Acórdão do TCU tem o mérito de reacender um debate que parecia adormecido depois de décadas de predomínio do pensamento neoliberal.
Para contribuir com o retorno deste importante debate, utilizarei meu blog para discutir esta questão.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Taxa de analfabetismo caiu... na Bolívia

Em 2005 a Bolívia tinha 11,7% de adultos analfabetos e o Brasil ostentava 11,1%. Na Bolívia, após a vitória do presidente Evo Morales, a situação vem mudando rapidamente.
No dia 2 de dezembro o Estado de La Paz foi declarado território livre do analfabetismo. Com essa declaração já são sete os departamentos bolivianos que conseguiram erradicar esta chaga social. Faltam apenas dois.
São resultados animadores conquistados em pouco tempo, graças ao apoio cubano e venezuelano ao Programa “Yo, si puedo”. E é resultado da firme decisão política do governo e de forte e autêntica mobilização social.
Na oportunidade o Coordenador do Programa no Departamento de La Paz, Pablo Quispe, explicou que naquele departamento se graduaram 228.534 analfabetos em trinta meses de campanha, que representa 97% de cobertura, tendo como referência o censo de 2007.
Há também uma forte preocupação de reforço das raízes indígenas bolivianas. No Departamento de La Paz foram alfabetizados 23.398 analfabetos na língua aymara e 1511 em quéchua.
Com este resultado no Departamento de La Paz, já são 322 municípios de um total de 327 que devem ser declarados livres do analfabetismo na Bolívia.
É inadmissível que o Brasil, com um PIB 25 vezes maior do que o país vizinho não consiga cumprir igual tarefa. E que, passados quase dez anos da aprovação do Plano Nacional de Educação, sigamos tendo 10% da população de 15 anos ou mais analfabeta.
Talvez a baixa execução do Programa Brasil Alfabetizado (45,8%) ajude a explicar o nosso fraco desempenho.

Contagem

Somente neste sábado é que inseri um contador de visitas no meu blog. Agradeço a todos que procuram informações educacionais neste espaço.

sábado, 6 de dezembro de 2008

Emenda Maldaner

O Projeto de Lei nº 3.776, de 2008, que tramita em regime de urgência na Câmara dos Deputados, tem por objeto a mudança da forma de correção do valor do piso salarial nacional para o magistério da educação básica pública. Recebeu pareceres favoráveis nas comissões a que foi submetido e brevemente estará pronto para votação em plenário.
A lei do piso tem suscitado reações contrárias de gestores públicos, especialmente dos governadores. As críticas são direcionadas a três aspectos: a) o fato do piso ser calculado sobre o vencimento inicial e não sobre a remuneração; b) a forma de correção do valor tendo por base o índice de correção do custo aluno nacional e; c) a extensão da hora-atividade para 33% da jornada de trabalho.
O deputado Celso Maldaner (PMDB-SC) aproveitou o ensejo oferecido pelo governo e apresentou uma emenda ao Projeto de Lei reduzindo o percentual de hora-atividade para 20% a 25% da duração total da jornada para atividades, tempo este que será destinado a “preparação e avaliação do trabalho didático, à colaboração com a administração da escola, às reuniões pedagógicas, à articulação com a comunidade e ao aperfeiçoamento profissional, de acordo com a proposta pedagógica de cada escola”.
Na Comissão de Educação e na Comissão de Administração e Trabalho a referida emenda não foi acatada pelos relatores e nem pelos referidos colegiados. Porém, o deputado federal Silvio Costa (PMN-CE), apresentou relatório apoiando a diminuição da hora-atividade e conseguiu a aprovação da maioria dos membros da Comissão de finanças e Tributação. Argumentou que tal medida, se aprovada, “proporcionará evidente economia ao erário ao evitar a contratação de novos professores”.
Antes mesmo de ser colocada em prática uma parte importante da Lei do Piso começa a ser destruída. É justamente contra o aumento da carga horária destinada a reuniões pedagógicas e outras atividades essenciais para elevar a qualidade educacional, que se dirigem todas as baterias dos governadores e de muitos prefeitos. E contam com a zelosa contribuição de deputados do quilate de Celso Maldaner e Silvio Costa.
Espero que a Lei do Piso não seja enterrada antes mesmo de ser testada. É o mínimo que os professores brasileiros aguardam dos seus representantes no Congresso Nacional.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

O preço de ser governo

Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 3.776 de 2008, que altera a Lei nº 11.738, de 16 de julho de 2008, que criou o piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério da educação básica. Basicamente a proposta visa modificar a forma de correção do valor do piso do magistério. Hoje esta correção será feita no mesmo percentual de correção do custo aluno nacional. Pela proposta o fator de correção será o INPC.
É uma proposta bem vista pelos gestores estaduais e municipais, porque diminui o impacto financeiro da implantação do piso e, obviamente, é uma proposta antipática para os professores, que consideram o valor do piso muito baixo e enxergam na correção pelo custo aluno nacional uma maneira de elevá-lo no decorrer dos anos.
A matéria tramita em caráter de urgência e é analisada simultaneamente nas comissões de Constituição e Justiça, Educação, Trabalho e administração e na comissão de Finanças.
Um dos deputados federais oriundos da luta sindical do magistério é Carlos Abicalil (PT-MT). Sempre tem participação ativa nas negociações de matérias educacionais. E tornou-se relator da matéria na Comissão de Educação, conseguindo aprovar o seu relatório na semana passada.
A leitura do voto do nobre relator mostra o quanto é pesada a carga que carrega um deputado governista. Deve ter bônus ser governo, com certeza. Mas neste caso considero que o ônus é bem maior. Senão vejamos.
No parecer o ex-dirigente da CNTE – Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação, entidade representativa de milhões de potenciais beneficiados pelo piso, assimila os principais argumentos contrários a manutenção da lei do jeito que foi aprovada no Congresso no mês de julho passado.

Afirma que “a elevação do piso salarial na mesma velocidade do crescimento das receitas disponíveis no Fundeb por aluno/ano engessará outros investimentos relevantes e necessários às redes públicas de ensino”, ou seja, dar ar de verdade ao fato de que a correção do piso impossibilita o funcionamento das redes de ensino. Utiliza inclusive um termo “engessará”, vocábulo constantemente usado para combater a vinculação constitucional para a educação.
Mais adiante deixa claro o alvo da medida. Afirma que

“De fato, se analisarmos o crescimento do ICMS, um dos principais impostos que compõem o Fundef, substituído pelo Fundeb a partir de 2007, veremos que sua variação nominal foi de 12,2% no período 2005/2004; de 10,9% no período 2006/2005; e de 9% em 2007/2006. Já o INPC apresentou a seguinte série nos últimos anos: 6,13% em 2004; 5,05% em 2005; 2,81% em 2006; e 5,15% em 2007”.

Aí está a essência do projeto: diminuir o percentual de correção do piso, reduzindo assim o seu valor, melhorando a vida dos gestores, mas prejudicando diretamente o magistério. Em 2008 a correção do custo aluno foi de 20% e nada indica que este índice diminua muito em 2009, mas o INPC não passará de 7%. É uma grande diferença.

E o nobre deputado, para minimizar posicionamento tão contraditório e incômodo, introduz um “bode na sala”. Afirma que a manutenção da lei trará um “potencial resultado negativo” que é a “fragilização dos planos de carreira”, pois a tendência será o achatamento dos salários mais altos devido às dificuldades financeiras dos estados e municípios. Ora, todos sabemos o quanto estes planos já estão fragilizados, mesmo sem a existência de piso nacional.
É dura a vida dos deputados governistas, principalmente daqueles que tem origem na luta do magistério.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Falta de transparência

Acaba de ser divulgada uma nota pública do Fórum Brasil do Orçamento (FBO), protestando contra o veto do Poder Executivo ao dispositivo previsto na Lei de Diretrizes Orçamentárias – LDO de 2009, de envio de demonstrativo de metas sociais ao Congresso Nacional.
O Fórum Brasil do Orçamento (FBO é uma articulação de organizações da sociedade civil e movimentos sociais brasileiros que defende a democratização dos processos orçamentários, a transparência e a ampliação dos recursos públicos aplicados na área social. Dentre as entidades que fazem parte do FBO estão o INESC - Instituto de Estudos Socioeconômicos, a CFEMEA - Centro Feminista de Estudos e Assessoria e o CORECON-RJ - Conselho Regional de Economia.
A Proposta de Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2009, aprovada pelo Congresso Nacional, estabelece que o Poder Executivo encaminhe, 15 dias após o envio do Projeto de Lei Orçamentária – PLOA de 2009, o demonstrativo, por área de governo, com a discriminação das principais metas sociais relativas a programas e ações, identificando os montantes financeiros e as respectivas metas físicas.
Segundo o FBO a idéia é “que o governo diga claramente no orçamento quais são as metas de redução das desigualdades sociais e quanto gastou no ano em curso, além de quanto pretende gastar nos anos seguintes para alcançar as metas estabelecidas, assim como é feito na esfera da política macroeconômica”.
Usando uma palavra da moda, nada mais republicano. Acontece que o Presidente Lula vetou este dispositivo.
Diante desse quadro, o Congresso Nacional tem em suas mãos a possibilidade de restabelecer a obrigatoriedade do demonstrativo de metas sociais, derrubando o veto do Presidente República. A argumentação de dificuldades operacionais para cumprir o dispositivo não pode justificar o veto.
É necessário tornar o Orçamento Federal mais transparente e de fácil fiscalização pelo povo brasileiro.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Dívida é a verdadeira prioridade


Analisando a execução orçamentária do governo federal disponível no SIGA Brasil do dia 1º de dezembro é possível concluir que o pagamento dos encargos da dívida interna e externa (ela ainda teima em existir mesmo diante dos seguidos desmentidos oficiais) é a verdadeira prioridade nacional.
Com o refinanciamento e serviço da dívida interna foram gastos 446,4 bilhões de reais. Somados a 17 bilhões deslocados para refinanciar e honrar os serviços da dívida externa, o gasto chega a 463,4 bilhões de reais, valor devidamente torrado com ‘nossa” dívida com credores e especuladores de toda a ordem.
Como o orçamento executado representa 1 trilhão de reais, este valor consumiu 45,2% de tudo que foi arrecadado pelo governo federal dos laboriosos contribuintes brasileiros.
Isso representa quase 13 vezes o aplicado pelo governo federal em saúde, mais de 24 vezes o investido em educação. E 665 vezes o aplicado em reforma agrária.
Esta prioridade tende a se aprofundar, pelo menos é o que apontam as medidas implementadas pelo governo para combater a crise econômica mundial. Nada de aumentar os gastos sociais, a prioridade é salvar os banqueiros, especuladores e até empresas que decidiram que era mais fácil ganhar dinheiro na ciranda financeira do que gerar emprego e aumentar a produção nacional.

Pesquisa educacional X avaliação em larga escala

A execução orçamentária (até 1º de dezembro de 2008) demonstra que o apoio a pesquisa educacional continua não sendo prioridade governamental.
O Programa “Estatísticas e Avaliações Educacionais”, praticamente todo sob a gerência do INEP tinha disponível para aplicação este ano o montante de 299 milhões de reais. Até agora executou apenas 140,5 milhões, ou seja, aplicou apenas 47%. Até aí nenhuma surpresa, pois a execução do Ministério está no geral muito ruim. Porém, há uma clara opção no perfil dos gastos deste setor. Do que foi aplicado apenas 5 milhões foram destinados ao apoio de pesquisas na área educacional, o que representa apenas 3,6%. Por outro lado, somente o ENEM consumiu 77 milhões de reais. A avaliação do ensino superior levou outros 16 milhões.
Está nítida a prioridade. A função do MEC tornou-se regular a oferta de educação no país, por meio de avaliações de larga escala e construção de indicadores educacionais baseados nos resultados de testes de aprendizagem.
Como já demonstrei anteriormente, o apoio e fomento para que estados e municípios superem as dificuldades, mesmo aquelas distorcidas por um olhar apenas na aprendizagem, ainda estão sendo cumpridas a conta gotas.

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

O ano já está no fim...

Pois é, o ano de 2008 já está terminando, faltando menos de um mês para entrarmos no período natalino e festas de fim de ano. Período em que as atividades públicas diminuem, funcionários tiram férias merecidas e as escolas perdem a alegria das crianças e adolescentes.
Antes que o clima de final de ano envolva a todos, quero comentar mais uma vez a execução orçamentária do MEC.
Faltando um mês para o final do ano e os dados de execução orçamentária do Ministério da Educação continuam ruins. Dados do SIGA Brasil coletados no dia 1º de dezembro mostram que o MEC executou apenas 67,5% do dinheiro que lhe foi destinado no Orçamento deste ano. Mantendo o mesmo ritmo, hipótese difícil devido aos inúmeros feriados de final de ano e a descontinuidade administrativa com transição de 5564 prefeitos em todo o país, o MEC deixará de aplicar nada mais nada menos do que 8,9 bilhões de reais, quase três vezes o valor previsto para ser repassado pela União para o Fundeb neste ano.
Os números mostram que programas fundamentais para minorar o caos educacional, especialmente na educação básica, apresentam desempenho sofrível. Vamos a alguns exemplos:

Programa Brasil Escolarizado: sua dotação autorizada é de 8,1 bilhões, mas até agora só conseguiu executar 5,6 bilhões, ou seja, apenas 68,5%. E isso só aconteceu porque é neste programa que são aplicados os recursos da União para complementar o custo-aluno dos estados mais pobres no Fundeb. Isso representa 51% do total aplicado no programa. Em seguida temos os recursos da merenda escolar e do dinheiro direto na escola, que ajudam a salvar a execução de números piores;

Programa Qualidade na Escola: com dotação autorizada de 1 bilhão, o que já não é muito, tem um desempenho de apenas 38% de execução. Concentrados em três ações (infra-estrutura da rede física, transporte e uma ação denominada apoio ao desenvolvimento da educação básica, na qual cabe qualquer coisa que seja necessário apoiar. O que mais angustia neste caso é que o discurso da qualidade tornou-se onipresente nas falas ministeriais, mas não impactaram até o momento a execução de seus programas;

Programa Brasil Alfabetizado: para enfrentar o desafio de alfabetizar 10 milhões de brasileiros (segundo PNAD 2007), este programa dispõe de 351 milhões, mas até agora conseguiu gastar apenas 160 milhões, ou seja, apenas 45,8%. É pouco recurso e péssimo desempenho diante de tão grave problema;

Programa Educação para a Diversidade e a Cidadania: sua dotação orçamentária é de 81 milhões, mas sua execução mostra que o setor praticamente foi fechado em 2008, conseguindo executar apenas 9 milhões (11,6%).

Recentemente li nos jornais que no ano de 2009 teremos mais recursos destinados ao MEC. Na prática aceitamos fazer parte de uma prática ilusionista todos os anos. O Governo propõe e o Congresso aprova um orçamento para a educação que todos sabem que não irá se realizar, seja pelos sucessivos contingenciamentos, seja pela dificuldade de executar convênios com estados e municípios ou por incapacidade técnica.
E todos saem de férias comemorando a boa notícia: ano que vem a educação terá mais recursos.
Será?

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Mobilizar desde já!


O MEC está convocando a Conferência Nacional de Educação – CONAE para os dias 23 a 27 abril de 2010, na cidade de Brasília. O Tema da CONAE, definido por sua Comissão Organizadora Nacional, será: Construindo um Sistema Nacional Articulado de Educação: Plano Nacional de Educação, suas Diretrizes e Estratégias de Ação.
A CONAE será precedida de Conferências Municipais, previstas para o primeiro semestre de 2009 e de Conferências Estaduais e do Distrito Federal programadas para o segundo semestre do mesmo ano.
A Comissão Organizadora do evento foi instituída pela Portaria Ministerial nº 10/2008 e é composta de 35 membros, a quem atribuiu as tarefas de coordenar, promover e monitorar o desenvolvimento da CONAE em todas as etapas. Na mesma portaria foi designado o Secretário Executivo Adjunto, Francisco das Chagas, para coordenar a Comissão Organizadora Nacional.
Analisando a Comissão Organizadora podemos verificar a seguinte composição:
Representação governamental (federal, estadual, municipal, representação CEFETs e Universidades Federais) -11 votos;
Representação dos trabalhadores - 7 votos;
Representação da sociedade civil (entidades, pais e estudantes) – 8 votos
Representação dos empresários – 4 votos
Legislativo – 2 votos;
Conselhos (nacional e entidades dos conselhos estaduais e municipais) – 3 votos
As Conferências sempre correm o risco de trilharem dois caminhos inócuos: ou se tornam atos de louvor aos méritos do governante de plantão ou conseguem aprovar um conjunto progressista de propostas, mas que terão como destino o arquivo público ou o fundo de uma gaveta ministerial.
O desafio é transformar a Conferência em espaço democrático de discussão das mudanças estruturais que a educação brasileira precisa.
O temário oferece dois grandes desafios. O primeiro, discutir e formatar um Sistema Nacional de Educação que seja digno deste nome, que divida as responsabilidades de forma proporcional ao potencial arrecadador de cada ente federado e que estabeleça formas compartilhadas de decisão, dentre outras coisas. O segundo desafio será fazer um rigoroso balanço do atual Plano Nacional de Educação, verificar por que o país ficou tão distante de suas metas e estabelecer nossas diretrizes e metas para os próximos dez anos.
De qualquer forma, é necessário que a sociedade civil, os educadores e os estudantes estejam atentos e mobilizados.

sábado, 29 de novembro de 2008

A força da corporação


Um dos problemas crônicos do Brasil é a saúde. Esse problema é resultado do baixo investimento público, da prioridade da medicina curativa contra o trabalho de prevenção e é agravado pela falta de médicos em muitos municípios.
Os Conselhos de Medicina, mesmo diante deste quadro alarmante, impedem que médicos brasileiros formados em Cuba exerçam a profissão no Brasil. Da mesma forma se colocam contra qualquer acordo entre governos municipais e médicos cubanos.
Ou seja, a maioria dos médicos formados no Brasil quer trabalhar nos grandes centros, de preferência em hospitais particulares, só aceitam trabalhar em municípios pequenos e longínquos por salários altíssimos e mesmo assim lá não duram mais do que alguns meses.
Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Decreto Legislativo 346 de 2007, que dá validade aos diplomas dos brasileiros que fizeram curso de medicina em escolas cubanas. Caso seja aprovado este projeto irá beneficiar 220 graduados que querem exercer a profissão e cerca de 500 futuros médicos que estudam neste momento em Cuba.
Temos muito que aprender com os cubanos e cuidar da saúde é uma delas, basta ver os indicadores daquele país, que sofre um impiedoso bloqueio econômico dos EUA e que não possui as riquezas que possuímos em nosso país.
Nesta semana a Comissão de Educação da Câmara deu uma demonstração de que mais vale poderosos lobbys do que a necessidade de nosso povo: por 17 votos a 12 aprovou parecer contrário ao Projeto de Decreto Legislativo.
A matéria tramita simultaneamente nas comissões de Justiça (onde recebeu parecer), Seguridade (não foi apresentado ainda) e Educação. Como tramita em regime de urgência, a matéria pode ser votada no Plenário, se o presidente Arlindo Chinaglia e o colégio de líderes assim o desejarem.
Para conhecer o teor do Projeto de Decreto Legislativo basta acessar:
www.camara.gov.br/sileg/integras/502918.pdf

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Retrato do abandono


Um estudo publicado pela UNESCO denominada Um olhar para o interior das escolas primárias, comparou dados de diversos países, entre eles os relacionados às condições de ensino. Segundo o informe, em quase 12% das escolas não há lugares suficientes para os alunos se sentarem. O estudo diz textualmente que, no Brasil, praticamente 50% das crianças do 1º ao 5º ano que estudam em escolas da zona rural e quase 25% das escolas urbanas têm aulas em edificações consideradas ruins.
Esta foto me foi mandada pelos professores da cidade de Senador José Porfírio, município de 14.300 habitantes, localizado na região oeste do Pará. É um retrato fiel do caos da educação brasileira, especialmente a que é oferecida nos pequenos municípios e, em especial, na área rural.
O município de Senador José Porfírio possui um IDEB para os anos iniciais de apenas 2,2 (média nacional de 4,2) e de 3,2 para os anos finais. Possui 17 escolas, sendo 12 na área rural, muito semelhantes a que a foto reproduz.
É um exemplo de que não basta o acesso. Pelos dados disponíveis nos portais do MEC e do INEP podemos aferir que 14,2% das crianças entre zero a três anos e 66% das crianças de quatro e cinco anos estão na escola. O acesso ao ensino fundamental está quase universalizado naquele município.
A reprovação chega a 35,7% na área rural nas primeiras séries. Isso sem falar que 31,7% dos maiores de 15 anos são analfabetos.
A pergunta merece resposta das autoridades educacionais: em que condições estamos universalizando o ensino fundamental? Em que condições estão sendo acolhidas as crianças da educação infantil?
Recuso-me a denominar de escola o que as fotos (sim, existem outras tão esclarecedoras do abandono como esta que reproduzo!) retratam. Uma “escola” desprovida de quaisquer condições de funcionamento e inadequada para o exercício do magistério.
Com este “padrão de qualidade” é impossível que nosso país consiga melhores resultados nos indicadores internacionais, ficando sempre disputando as últimas posições com os países mais pobres do mundo.

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Campinas cria Prouni municipal e descumpre LDB

No dia 18 de novembro deste ano, a Câmara Municipal de Campinas aprovou a Lei nº 13.470, que criou o Programa de Inclusão Social pelo Ensino Superior de Campinas – PROCAMPIS.
No geral o PROCAMPIS é uma cópia do PROUNI federal e funcionará da seguinte forma:
Concede bolsas de estudo integrais e parciais para estudantes de cursos de graduação e cursos seqüenciais de formação específica em instituições privadas de ensino superior.
Concede bolsas integrais para alunos com renda familiar mensal per capita de até 2 salários mínimos. E bolsas parciais de 51% a 70% para renda mensal per capita de até 3 salários mínimos. E ainda, bolsas parciais de 30% a 50% para renda mensal per capita de até 3,5 salários mínimos. Serão 40% de bolsas integrais.
O aluno precisa ser aprovado no processo seletivo da instituição privada.
Critérios para disputar as bolsas: a) cursado ensino médio completo em escola de rede pública; b) ser portador de deficiência; c) ser servidor municipal, preferencialmente professor (somente se tiverem renda familiar mensal até 6,5 salários mínimos, mas em compensação ser professor é o primeiro critério de desempate).
Concessão de bolsas na proporção de 1 bolsa para cada 42 alunos matriculados e pagantes na instituição privada.
O Termo de Adesão das instituições privadas terá prazo de vigência de 10 (dez) anos.
As instituições terão dois benefícios fiscais: a) moratória de dois anos de parte devida de ISSQN e b) redução da alíquota do referido imposto para 2% sobre o faturamento auferido com mensalidades.
Será desvinculado do PROCAMPIS o curso considerado insuficiente segundo critérios de desempenho do SINAES do Ministério da Educação, por duas avaliações consecutivas.

Além de ser uma cópia do que já existe em nível federal, a proposta aprovada por Campinas contraria totalmente a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9394/96).
Em primeiro lugar é bom recordar que a oferta de ensino superior é dever constitucional da União. Aliás, dever exclusivo que foi sendo complementado pelos estados e por alguns municípios, pela falta de investimentos federais no setor. Por causa disso, em 2006 instituições municipais ofereceram mais de 60 mil vagas de ensino superior.
A União, por intermédio do PROUNI concede bolsas em Campinas. Em 2008 foram 734 alunos beneficiados, estudando em 10 instituições de ensino superior.
Em segundo lugar, o artigo 5º da LDB estabelece que a prioridade é a oferta do ensino fundamental e somente depois a oferta das demais etapas e modalidades, conforme o dever de cada ente federado.

Artigo 5º...
§ 2º. Em todas as esferas administrativas, o Poder Público assegurará em primeiro lugar o acesso ao ensino obrigatório, nos termos deste artigo, contemplando em seguida os demais níveis e modalidades de ensino, conforme as prioridades constitucionais e legais.

Cabe ao município a oferta do ensino fundamental e da educação infantil, além das modalidades atinentes a estas etapas. Não cabe constitucionalmente a oferta de ensino superior, seja por via direta, seja por compra de vagas ou mesmo troca de bolsas por isenção fiscal.
Em terceiro lugar, o artigo 11 é taxativo: um ente federado somente pode prestar serviços educacionais fora de sua competência legal, após de ter conseguido cumprir o seu dever. E isso com recursos públicos que não façam parte dos mínimos constitucionais.

Artigo 11...
V - oferecer a educação infantil em creches e pré-escolas, e, com prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino.

Ou seja, a Prefeitura Municipal de Campinas poderia trocar bolsas de estudos no ensino superior por isenção fiscal em alguma hipótese? Sim, caso tivesse proporcionado o acesso a todas as crianças em idade escolar na educação infantil e ensino fundamental e utilizando outros recursos orçamentários.
Infelizmente não é o caso de Campinas.

Pela projeção populacional feita pelo IBGE, a cidade de Campinas possuía em 2007 uma população de zero a quatorze anos de 257.474 crianças. Os dados do Censo Escolar de 2008 apontam para o atendimento na educação infantil e ensino fundamental, somando todas as redes (municipal, estadual e privada) de 162.511 alunos. Uma conta simples mostra que estão fora da escola 94.963 cidadãos.
O déficit educacional é maior dentre as crianças de zero a cinco anos, faixa etária que é de atendimento exclusivo municipal. São mais de 44 mil crianças fora da escola.
A concessão de bolsas será feita por meio de redução da alíquota do ISSQN. Todos sabem que 25% de todo dinheiro arrecadado pela Prefeitura deve ser destinada a educação. Assim, de cada 1 real de renúncia fiscal para conceder bolsas para alunos do ensino superior, 25 centavos estão sendo retirados da educação básica municipal.
Não sabemos o quanto de renúncia fiscal a Prefeitura calcula em suportar, mas sabemos que o ISSQN é um imposto significativo para a municipalidade. Em 2007 foram arrecadados R$ 273.609.574,37 de ISSQN. Isso quer dizer que deste imposto foram destinados pelo menos R$ 68.402.393,59.
O vereador Paulo Búfalo (PSOL) me informou que pretende ingressar com uma ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) contra a lei aprovada. É o mínimo que deve ser feito diante de tamanha ilegalidade e falta de prioridade com a educação municipal.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

No final da fila


A imprensa brasileira repercutiu dados de relatório publicado pela UNESCO acerca do cumprimento das metas do milênio pelos países na área da educação.
No documento é constatado que o Brasil conseguiu reduzir a reprovação no ensino fundamental entre 1999 e 2005, fato sempre lembrado pelas autoridades governamentais de nosso país. Segundo o relatório anual da entidade que monitora o grau de cumprimento das metas traçadas em 2000 na Conferência Mundial de Educação, o Brasil conseguiu reduzir sua repetência de 24% para 19%.
Porém, esta melhoria não tirou o Brasil da incômoda companhia daqueles que se encontram no final da fila: entre 150 nações comparadas, apenas Nepal, Suriname e 12 países africanos têm repetência maior.
A média mundial de reprovação estaria em torno de 3% e mesmo numa das regiões mais pobres do mundo, a África subsaariana, os indicadores são melhores do que o brasileiro (13% contra 19%).
A alta repetência é o maior entrave para a melhoria do Brasil no Índice de Desenvolvimento da Educação (composto de quatro dimensões: acesso à escola, desigualdade de gênero, analfabetismo adulto e qualidade), que faz um ranking de países segundo o cumprimento das metas estipuladas em 2000. O país ficou na 80ª posição entre 129 para os quais foi possível calculá-lo. Há quatro anos, a posição brasileira era a 72ª em 127 nações.
O índice avalia a qualidade educacional por meio do percentual de alunos que completam ao menos quatro anos de educação formal. Nesse aspecto, o Brasil cai da 80ª para a 99ª posição. Já quando se trata apenas de acesso à escola, sobe para 59ª.
Toda vez que pesquisas comparativas internacionais são divulgadas diminui o ímpeto otimistas das autoridades locais. E, infelizmente, sempre aparecemos perto do final da fila, em companhia de países pobres, sem potencial econômico para dar um salto de qualidade na área educacional.

terça-feira, 25 de novembro de 2008

PL das Cotas: alcance pequeno

A presente proposta de lei atinge de forma obrigatória apenas as instituições federais de ensino.
Os dados do censo do ensino superior mostraram que em 2006 foram oferecidas 2,6 milhões de vagas, mas que apenas 144.445 foram ofertadas nas universidades federais. Esse número representou apenas 5,5% do total das vagas.
Ou seja, o projeto de lei aprovado na Câmara atinge apenas 50% das vagas federais (72.223), influenciando em apenas 2,7% do montante de alunos que ingressam todos os anos no ensino superior.
Para a última prova do ENEM participaram mais de um milhão de concluintes do ensino médio, sendo que 77% são oriundos das escolas públicas e 16% das escolas particulares.
O ingresso de alunos no ensino superior em 2008 não está disponível, mas temos o dado que em 2006 foram ofertadas apenas 331.105 vagas nas instituições federais, estaduais e municipais. Isso sem considerar que o censo chama de públicas instituições públicas como a Universidade Estadual do Vale do Acaraú, que como todos sabem de pública só tem o nome.
Esse dado por si só mostra que o acesso à universidade pública funciona como um cruel funil. E que o atual projeto de lei não enfrenta as duas principais causas da dificuldade de acesso dos alunos da rede pública no ensino superior:
1. A maioria das vagas é privada (87,4%), excluindo os que não possuem meios para pagar as mensalidades;
2. As vagas públicas são poucas e representam apenas 1/3 da necessidade dos que são oriundos das universidades públicas;
O Projeto enfrenta o fato de que os alunos da rede privada disputam em melhores condições as vagas federais públicas. Mas a sua incidência sobre o total, pela forma que está redigido, é muito pequena.
É uma iniciativa importante, mas insuficiente para alterar os dados injustos atuais.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Isenção em troca de vagas


A prioridade do governo federal tem sido incluir os estudantes pobres, negros e indígenas por intermédio de bolsas de estudos em instituições privadas, sejam elas com fins lucrativos, sem fins lucrativos não beneficientes ou mesmo beneficientes de assistência social.
Dados disponíveis no portal do MEC mostram que houve um crescimento em mais de 100% da oferta de bolsas de 2005 para 2008.
Em troca de renúncias fiscais, as entidades “oferecem” bolsas totais ou parciais e os candidatos são selecionados seguindo critérios inclusivos.
Os dados afirmam que ocorre uma maior inclusão de pretos e pardos do que normalmente se consegue sem este incentivo. São 32,8% de pardos e 12,6% de pretos.
Desde o debate legislativo quando da aprovação do Prouni ficou clara a estratégia de gerar vagas a um custo mais barato do que seria sua criação nas universidades públicas.
Prova disso é que a taxa de crescimento das vagas nas universidades públicas federais durante o primeiro governo Lula foi de apenas 16%, o que quis dizer mais 20.249 novas vagas.
Em 2006 a rede federal ofertou 144.445 vagas e o número de bolsas do Prouni foi quase do mesmo tamanho (138.668). Como o governo declara que em 2008 foram ofertadas 225.005 bolsas e o ritmo de crescimento das vagas nas universidades é menor, esta realidade se encontra claramente favorável a política de troca de impostos por vagas em instituições privadas.
Duas atitudes são necessárias para que o Projeto de Lei das Cotas, recentemente aprovado na Câmara dos Deputados tenha algum efeito:
1. Mudança nas prioridades governamentais, com expansão em taxas mais altas das vagas públicas; e
2. Obrigatoriedade de reserva de vagas para alunos oriundos da escola pública e para negros e indígenas nas instituições particulares, estaduais e municipais.

domingo, 23 de novembro de 2008

Universidade branca


Está disponível no sitio oficial do INEP um portal com dados do ensino superior. E para oportunizar o debate acerca da necessidade de serem estabelecidas políticas afirmativas para os negros em nosso país, selecionei alguns dados acerca do perfil dos docentes de nossas instituições de ensino superior.
Os dados apontam para a existência de 292.407 docentes no ensino superior. Agrupando-os pela cor/raça declarada chegamos a seguinte constatação: a docência do ensino superior é esmagadoramente exercida por brancos, que representam 70,7% do total. Em segundo lugar vem um conjunto de docentes que não declaram sua raça/cor (16,7%). Os pardos somam 9,4% e os negros apenas 1,7% dos professores universitários.

O mais preocupante é que este números estão longe de refletir a distribuição das raças em nossa população. Levantamento do IBGE relativo a 2006 indica que os brancos representam 49,7%, os pretos 6,9% e os pardos 42,6%.

Os dados nos mostram também que nas áreas de conhecimento que possuem profissionais melhor remunerados ou nas quais os cursos são mais dispendiosos, a presença negra é menor. Os negros estão um pouco melhor representados na área de educação, com 2,8% do total, enquanto representam apenas 1,1% dos professores das engenharias. Existem 61 professores brancos para cada professor negro nesta área de conhecimento. Na área de saúde e bem-estar esta proporção é de quase 53.
Como para alcançar uma cadeira de professor universitária significa ter alcançado o título de mestre ou doutor, deduz-se facilmente que o funil racial aqui comentado nada mais é do que a reprodução do funil mais geral, de entrada na universidade.O estabelecimento de políticas afirmativas que garantam o ingresso de negros e pardos em maior proporção, igualmente distribuídos entre todos os cursos, é fundamental para iniciar a reversão deste quadro.

sábado, 22 de novembro de 2008

Sistema de cotas foi aprovado na Câmara

No dia 20 de novembro último, a Câmara dos Deputados aprovou o substitutivo apresentado pelo deputado federal Carlos Abicalil (PT/MT) a vários projetos de lei que tratavam de cotas para negros e indígenas nas universidades brasileiras.
Em resumo o Projeto aprovado na Câmara e que se segue para análise no Senado estabelece que:

1. Reserva de, no mínimo, cinqüenta por cento das vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas;

2. A seleção será feita por coeficiente de rendimento (CR) alcançado pela média aritmética das notas obtidas no ensino médio;

3. A reserva de vagas será preenchida:
a) Metade das vagas, por curso e turno, por autodeclarados negros e indígenas, no mínimo igual a proporção de pretos, pardos e indígenas existentes em cada Estado, conforme dados do IBGE;
b) Metade por estudantes oriundos de famílias com renda per capita de até 1,5 salário mínimo;

4. As universidades federais terão quatro anos para implantar o novo sistema, sendo obrigadas a oferecer 25% de vagas da quota a cada ano, ou seja, 12,5% do total por ano;

5. A regra é obrigatória também para instituições federais de ensino técnico, que reservarão 50% de vagas para alunos oriundos do ensino fundamental de escolas públicas.

6. A implementação da lei é facultativa para as instituições de ensino superior privadas;

7. O MEC e a SEPPIR são responsáveis pelo monitoramento;

8. O programa deve ser reavaliado após 10 anos de sua aplicação.

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Primeiro as crianças, depois os bancos

No dia de ontem (20.11) ocorreu no Senado Federal uma sessão especial para lançar um Pacto Global pela Cidadania da Infância. Um discurso chamou atenção por ter lembrado que não é possível dar um futuro as nossas crianças sem que haja uma mudança radical na política econômica em nosso país.
Reproduzo parte do pronunciamento do Senador José Nery Azevedo (PSOL-PA). Ele teve a coragem de falar no tema que a grande mídia considera intocado. Em meio a mais grave crise econômica do capitalismo desde 1929, milhões de seres humanos serão levados a situação de miséria. E junto com os adultos irão milhões de crianças, comprometendo o futuro da humanidade. E só se fala em salvar os donos das empresas e dos bancos.

(...) Srs. Senadores, Srªs Senadoras, na oportunidade em que este Senado se debruça sobre o lançamento oficial do 1º Pacto Global pela Cidadania da Infância, gostaria de apresentar algumas reflexões.
Inicio afirmando que não é possível tratar da infância de maneira isolada, compartimentada. Valorizar a infância significa priorizar uma série de medidas que estão sob a responsabilidade de diferentes ministérios e promover ações articuladas pela União, pelos Estados e pelos municípios. E o que significa valorizar a infância? Em primeiro lugar, significa dar acesso, desde cedo, a todas as crianças brasileiras, especialmente as mais pobres, a uma vaga numa unidade escolar de educação infantil.
Os dados divulgados pelo IBGE, mais recentes, mostram que apenas 17,1% das crianças de zero a três anos freqüentam um banco escolar e ainda temos mais de 32% de crianças de quatro a seis anos privadas do acesso educacional. E vale lembrar que a responsabilidade desse atendimento está depositada nas costas do ente federado mais fraco, o Município.
É necessário também garantir que as crianças sobrevivam, ou seja, é fundamental proteger a saúde das novas gerações. Para isso é necessário investir em prevenção de doenças, especialmente as que matam milhões de pequenos brasileiros, as chamadas doenças da pobreza.
Dados de 2006, disponibilizados pelo Ministério da Saúde, mostram que apenas 58% da população têm acesso ao atendimento preventivo, via Programa de Ação Comunitária de Agentes da Saúde (PACS) ou Saúde da Família. E que a cada cem crianças menores de dois anos, quase quatro são internadas com diarréia, e, de cada mil crianças com menos de cinco anos, oitenta e duas são internadas com pneumonia e dez com desidratação.
É necessário proteger nossas crianças da agressão, da violência doméstica e das ruas, garantindo um lar estável e que possa prover um lar estável. Para isso é necessário que exista uma rede de proteção social funcionando. E isso está muito longe de acontecer em nosso País.
Ofereço um pequeno exemplo, do meu Estado do Pará. Basta percorrer os rios que contornam o arquipélago do Marajó para ver o triste espetáculo de crianças oferecendo o corpo por um pouco de comida.
Infelizmente, a prioridade do Governo não é a área social. Basta ver que o gasto com o pagamento dos juros da dívida dos últimos sete anos foi oito vezes maior do que os destinados à educação, quatro vezes maior do que o valor aplicado em saúde e mais de treze vezes maior do que o total de recursos aplicados em investimento público Federal.
No ano que vem, o Governo Federal vai gastar quase metade do Orçamento em pagamento de encargos com credores da dívida pública. E, com o agravamento da crise, isso tende a piorar.
Diante da crise econômica mundial, diversos organismos internacionais afirmam que teremos quase 200 milhões de pessoas no desemprego, ou seja, sem condições de prover o sustento de suas famílias, colocando em risco um número imenso de crianças.
E qual é a preocupação central dos governos do mundo inteiro? Salvar primeiro os banqueiros e os especuladores, cortar gastos públicos, para juntar recursos para garantir que esses senhores possam dar um futuro aos seus filhos, não aos filhos da maioria da sociedade.